Entre o envio de artigos para O Pasquim e de músicas endereçadas para Gal e Bethânia, Caetano Veloso lançou em 1971 seu primeiro disco produzido durante o exílio. Com selo Famous, da Paramount Records, o álbum possui seis canções em inglês e a sentida regravação de "Asa branca", de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Seguindo o clima do disco anterior, "Caetano Veloso" é marcado pelo sentimento de tristeza. Porém, aqui, ao invés da capa toda branca, Caetano fez questão de mostrar-se sob o frio, com casaco de pele e barba por fazer, num semblante envelhecido em comparação à habitual imagem do jovem tropicalista estampada nas capas de revista. Ele começa o álbum falando que teve que sair do país e que naquele dia foi impossível chorar. "Maria Bethânia" clama por boas notícias vindas do Brasil, e foi ela, justamente, quem conseguiu a autorização para o irmão retornar temporariamente ao Brasil para acompanhar as comemorações dos quarenta anos de casamento de seus pais. "If you hold a stone" retoma "Marinheiro Só" e traz "Quero voltar pra Bahia", de Paulo Diniz, feita para ele: "Caetano Veloso escreveu uma carta para um amigo meu, dizendo que estava aprendendo inglês, que estava morrendo de saudades do Brasil e da Bahia. Então escrevi a música, que em certa parte diz: “Eu não vim aqui para ser feliz, cadê o meu sol dourado, cadê as coisas do meu país”".
Caetano: "Ralph Mace estava animado com nosso trabalho e completamos o primeiro disco. A princípio Lou Reisner era o produtor (e fez faixas fundamentais como London, London e In the hot sun of a Christmas day), mas ele e Mace se desentenderam e este último tomou as rédeas. Até hoje esse disco me desagrada por lembrar-me demais minha depressão e minhas limitações pessoais. Mas foi um sucesso de estima brasileiro e a faixa Asa-Branca, uma versão pessoal e harmonicamente pobre do clássico de Luiz Gonzaga, justificava para mim a existência do disco." (Caetano Veloso. Verdade Tropical. Companhia das Letras, 1997).
"Esse é deprimidérrimo. É o primeiro do exílio em Londres. Eu estou horrível na foto da capa. Tinha até barba e eu não suporto barba. Nunca consegui gostar de London, London. Gosto só de um verso: "green grass, blue eyes, gray ski, God bless". A música deveria ser London e ter só este verso. Outro dia fui convidado para jantar com os príncipes ingleses e me botaram à mesa do lado da princesa Diana. Ela riu quando eu disse que tive a coragem de fazer uma canção em inglês que se chama London, London. Essa situação de pensar naquilo me deu uma tristeza enorme. Voltei daquele jantar bem triste. Me senti entre os humilhados da Terra. Em Londres eu me sentia pior do que isso. Não por Londres. Por ter sido preso e expulso do país. A canção Maria Bethânia tem um refrão legal, quando digo "Beta, Beta..." Mas não tenho facilidade de me aproximar deste disco. Agora é histórico. É o primeiro disco em que toco violão. Os ingleses me libertaram para o violão. Achavam lindo o meu jeito de tocar e os brasileiros achavam horrível. Se eu não tivesse sido preso e exilado, talvez nunca tocasse um violão num disco." (Caetano Veloso parao Jornal do Brasil, 1991).
"Quando o diretor de cinema Rogério Sgarzela esteve em Londres perguntou-me se a música Maria Bethânia não era falta de assunto. Eu lhe respondi: "Estou tão só e sem perspectiva que não tenho vontade de fazer nada. Acho incrível terem me contratado para gravar um disco. Gravar é minha profissão, mas falarei de coisas mais pessoais, de Bethânia, em inglês que ela não entende. Para mim, poeticamente, resolve esse meu problema de solidão". (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1973).
"Eu não gosto mesmo é do primeiro disco de Londres. Só gosto da gravação de Asa Branca. Acho que salva o disco, mas do resto não gosto. Mas aí tem problemas pessoais. Acho triste, acho deprimido. Já Transa é diferente, é lindo. Em Transa eu comecei a cantar bem." (Caetano Veloso para O Globo, 1981).
"Primeiro disco que fiz em Londres.
Tem coisas muito interessantes, como a gravação de Asa Branca, de Luiz Gonzaga
e Humberto Teixeira, que também rendeu muitos comentários por aqui. Quando o
disco saiu, era a gravação de que eu mais gostava. Tem London, London, tem a
faixa Maria Bethânia, que também acho muito bonita, com arranjos lindos, onde
faço improvisações acompanhado por um quarteto de cordas excelente, sugerido
pelo produtor e que havia participado das gravações do disco Eleanor Rigby, dos
Beatles. Foi produzido por Ralph Mace e por Lou Reizner, um produtor americano
famoso, que estava morando em Londres e morreu pouco tempo depois. O Ralph
dirigia o Fames, um selo da Paramounth. Os produtores de lá adoraram o nosso
trabalho, meu e do Gil. Fizeram esse meu primeiro LP gravado lá, fizeram o do
Gil e também o meu segundo, o Transa. Na edição que saiu aqui, pela PolyGram,
tem mutilações em duas faixas, A little more blue e Maria Bethânia. Foram
cortadas pela censura, grosseiramente. Tiraram trechos inteiros, porque os
censores aqui ouviram expressões que eu não disse. Quando falo em Libertá
Lamark, que era uma atriz argentina, eles pensaram que eu estava pedindo
"liberdade para Lamarca". Os produtores desse disco é que
insistiram para que eu tocasse violão nas gravações. Mostrei as canções que
seriam para o disco e expliquei: "Olha, estou mostrando aqui, mas quem
vai tocar é o Gil." Mas eles disseram: "Você é que tem que tocar". Fui lá e toquei tudo, o meu violão está inteiro nesse disco, toco em Asa
Branca, em Maria Bethânia, em London, London. E ainda batuco. Eles, os
produtores, me deixaram muito à vontade. Como músico, não fiquei intimidado
como costumava ficar no Brasil. Essa bossa nova mal-tocada, esse baião ou
essa toadinha moderna mal-tocada que fazemos aqui, eles acham maravilhoso. Se
eu tivesse ficado aqui, não teria me desenvolvido musicalmente." (Caetano Veloso. Livro "Tantas Canções" do box "Todo Caetano". Universal Music, 2002).
"Lá a gente poderia trabalhar, então poderia procurar trabalho e trabalhar, se quisesse, e ganhar dinheiro, se conseguisse. E depois, uma vez lá, eu fiquei sabendo que a gente poderia receber daqui, pois nossas músicas não estavam proibidas de tocar. Eu tinha feito Atrás Do Trio Elétrico e estava preso e nem vira fazer sucesso no carnaval, depois Gal gravou Você Não Entende Nada e algumas outras. Eu podia receber, Gil também, havia um limite que nos era possível receber e o resto ficava guardado aqui com a Tia Léa, que era tia de Dedé e de Sandra, respectivamente minha mulher e a mulher de Gil. Ela que fazia isso pra ajudar a gente, depois começou a fazer isso profissionalmente. Então a gente recebia o dinheiro do que a música nos rendia no Brasil. Recebia limitadamente, o resto ela guardava aqui.. pra quando a gente voltasse. Apareceu Ralph Mace, que foi nos procurar... porque ele tinha saído da Philips e ido pra Paramount, que abriu um selo chamado Famous. Ele soubera na Philips que esses dois exilados brasileiros tinham chegado e, como estava nesse novo selo, pagou pra ver. A Philips local não teve interesse nenhum, e pela gravadora ele nem teria ido. Mas ele, pessoalmente, sozinho em outra gravadora, foi nos procurar pra ver como era e, ao nos ouvir, ficou encantado, segundo ele. E quis fazer um disco com cada um de nós. Pra minha surpresa, ele quis fazer primeiro o meu logo. E eu não queria tocar, o Gil deveria tocar. "Como não toca violão? Vai gravar sim, ninguém toca como você!" Aí foi uma grande mudança, ele produziu esse disco e ele me pediu para fazer canções em inglês. Eu já falava um pouquinho e fiquei falando um pouco mais lá. "O estilo é maravilhoso, é um negócio diferente, não é bossa nova, é brasileiro, é novo e é internacional". Ele gostou muito, a princípio chamou um produtor americano importante – Lou Reizner, que havia feito coisas com gente grande. Ele era um sujeito legal, teve uma doença e morreu pouco tempo depois. Ele quis produzir, mas o próprio Ralph Mace tinha captado melhor a nossa coisa. Lou tinha orçado gastos excessivos, não bem explicados, então Mace acabou assumindo a produção. Menos da metade foi produzida pelo outro, o resto foi pelo Mace mesmo. Os técnicos eram mais sisudos que os brasileiros, eram super neutrais e eu achava a coisa meio fria. Mas o Mace era mais animado, caloroso e carinhoso. Fui fazendo o disco, mas estava surpreso dele querer fazer meu disco, achei que primeiro fosse querer gravar o Gil. Estava me sentindo muito fraco, mentalmente deprimido. Tìnha horror ao que tinha acontecido com minha vida e com o Brasil. Tudo era muito difícil de assimilar, mas fiz o disco e correspondi às expectativas do Ralph Mace. Eu me lembro que ele adorou London, London e mostrava para seus amigos ingleses. Fui fazendo, achando bonzinho o que estava acontecendo e já dando graças a Deus. Esse disco tem essa carga". (Depoimento para a Coleção Caetano Veloso 70 anos, 2012).
Texto da contracapa
CAETANO VELOSO was a superstar in Brazil. He came to England and decided to make London his home in the summer of 1969. A French saint once said that it is as dangerous for a writer to try a new language as it is for a believer to try a new religion: he can lose his soul. Caetano adopted English for the lyrics on this album to convey his first impressions of living in a foreing country. The songs serve as a two-way mirror, focusing thoughts and memories of home and absent friends and reflecting his reaction to a new but friendly environment.
A LITTLE MORE BLUE and LONDON, LONDON were the very first songs to be written after leaving Brazil.
MARIA BETHÂNIA is one of the most popular singing stars in Brazil; she is also Caetano's sister.
IF YOU HOLD A STONE, which is dedicated lo Lygia Clark, and SHOOT ME DEAD are contemporary proverbs.
IN THE HOT SUN OF A CHRISTMAS DAY: an epic hiding behind the cloak of a carol.
ASA BRANCA which was written by Luiz Gonzaga is a song about migration and home sickness...
"When your tears met the dry land
and spread the green of your eyes
over the dead trees
I promise you that
Then I'll be back, dear,
Then I'll be back, dear,
Then I'll be back."
Tradução livre: CAETANO VELOSO é um superstar no Brasil. Ele veio para a Inglaterra e decidiu fazer de Londres sua casa no verão de 1969. Um santo francês disse uma vez que é tão perigoso para um escritor tentar uma nova língua quanto para um crente tentar uma nova religião: ele pode perder a alma dele. Caetano adotou o inglês para as letras deste álbum para transmitir suas primeiras impressões de viver em um país estrangeiro. As músicas servem como um espelho de mão dupla, focando pensamentos e memórias de casa e amigos ausentes e refletindo sua reação a um ambiente novo, mas amigável.
A LITTLE MORE BLUE e LONDON, LONDON foram as primeiras canções a serem compostas após a saída do Brasil.
MARIA BETHÂNIA é uma das cantoras mais populares do Brasil; ela também é irmã de Caetano.
IF YOU HOLD A STONE, que é dedicada a Lygia Clark, e SHOOT ME DEAD são provérbios contemporâneos.
IN THE HOT SUN OF A CHRISTMAS DAY: um épico escondido atrás do manto de uma canção de natal.
ASA BRANCA que foi escrita por Luiz Gonzaga é uma canção sobre migração e doenças em casa ...
"Quando suas lágrimas encontraram a terra seca
e espalhe o verde dos seus olhos
sobre as árvores mortas
Eu te prometo que
Então eu volto, querida,
Então eu volto, querida,
Então eu estarei de volta."
Lista de Músicas
SIDE 1
1 - A LITTE MORE BLUE
(Caetano Veloso)
2 - LONDON, LONDON
(Caetano Veloso)
3 - MARIA BETHANIA
(Caetano Veloso)
SIDE II
1 - IF YOU HOLD A STONE
(Caetano Veloso)
2 - SHOOT ME DEAD
(Caetano Veloso)
3 - IN THE HOT SUN OF A CHRISTMAS DAY
(Caetano Veloso, Gilberto Gil)
4 - ASA BRANCA
(Luiz Gonzaga, Humberto Teixeira)
Vamos às Letras.
1 - A Little More Blue (Caetano Veloso)
One day I had to leave my country, calm beach and palm tree
That day I couldn't even cry
And I forgot that outside there would be other men
But today, but today, but today, I don't know why
I feel a little more blue than then
The day Carmen Miranda died
They put a photograph in the magazine
Her dead mouth with red lipstick smiled
And people cried, I was about ten
But today, but today, but today, I don't know why
I feel a little more blue than then
One morning they came around to take to jail
I smiled at them and said – all right
But alone in that same day's nigth I cried and cried again
But today, but today, but today, I don't know why
I feel a little more blue than then
One night I saw a Mexican film
These twin brothers tried to kill each other
But Libertad Lamarque, who was the mother
Suddenly appeared between them [Trecho censurado]
She opened her arms and got two bullets
And died sweetly without a sigh
But tonight, but tonight, but tonight, I don't know why
I feel a little more blue than then
One day I went down to the underground but
I missed the last train
And now that I'm just looking around
I feel a little more blue than then
Looking around
I don’t know why
I feel a little more blue than then
Comentário do autor: "A edição brasileira [do disco] tem um corte em “A little more blue”, feito pela censura. Eu fazia uma menção à (atriz argentina) Libertade Lamarque e eles pensaram que eu estava pedindo liberdade para Lamarca [Carlos Lamarca foi um militar desertor e guerrilheiro brasileiro] (risos)." (Caetano Veloso em entrevista para o Jornal O Globo, 2012).
2 - London, London (Caetano Veloso)
I'm wandering round and round, nowhere to go
I'm lonely in London, London is lovely so
I cross the streets without fear
Everybody keeps the way clear
I know I know no one here to say hello
I know they keep the way clear
I am lonely in London without fear
I'm wandering round and round here, nowhere to go
While my eyes go looking for flying saucers in the sky
Oh Sunday, Monday, Autumn pass by me
And people hurry on so peacefully
A group approaches a policeman
He seems so pleased to please them
It's good, at least, to live and I agree
He seems so pleased, at least
And it's so good to live in peace
And Sunday, Monday, years, and I agree
While my eyes go looking for flying saucers in the sky
I choose no face to look at, choose no way
I just happen to be here, and it's ok
Green grass, blue eyes, grey sky
God bless silent pain and happiness
I came around to say yes, and I say
But my eyes go looking for flying saucers in the sky
Yes, my eyes go looking for flying saucers in the sky
While my eyes go looking for flying saucers in the sky
Comentário do autor: ""Flying saucers" não é nada literal. Eu nunca procurei discos voadores no céu porque não tenho vontade nenhuma de ver disco voador e tinha uma grande rejeição à essa ideia, porém os discos voadores eram justamente a obsessão de todos os meus amigos, a começar pelo Gil. Durante os quatro meses, entre a prisão e o exílio, que nós passamos na Bahia. Então aquilo era simplesmente saudade da Bahia. Eu achava aquilo uma coisa idiota, mas aquilo era para sair... mas a Bahia era impossível, era uma imagem de saída, uma imagem simbólica que representava a Bahia." (Caetano Veloso em entrevista nos extras do DVD Cê Ao Vivo, 2007).
"Outro dia, eu estava jantando com Paulinha [Lavigne] em São Paulo, e minha gravação de London, london tocou no serviço de som. Achei horrível; me deu uma aflição. Que música horrorosa! E aquele meu jeito de cantar... Eu dizia: meu Deus, não é o que eu quero ser! Não existe nem sinceridade nem beleza naquilo ali." (Caetano Veloso em entrevista a Geneton Moraes Neto, Jornal do Brasil, 1989).
3 - Maria Bethânia (Caetano Veloso)
Everybody knows that our cities were built to be destroyed
You get annoyed, you buy a flat, you hide behind the mat
But I know she was born to do everything wrong with all of that
Maria Bethânia, please send me a letter
I wish to know things are getting better
Better, Beta, Beta, Beta, Bethânia
Please send me a letter
I wish to know things are getting better
She has given her soul to the devil but the devil gave his soul to God
Before the flood, after the blood, before you can see
She has given her soul to the devil and bought a flat by the sea
Maria Bethânia, please send me a letter
I wish to know things are getting better
Better, Beta, Beta, Beta, Bethânia
Please send me a letter
I wish to know things are getting better
Everybody knows that it’s so hard to dig and get to the root
You eat the fruit, you go ahead, you wake up on your bed
But I love her face ‘cause it has nothing to do with all I said
Maria Bethânia, please send me a letter
I wish to know things are getting better
Better, Beta, Beta, Beta, Bethânia
Please send me a letter
I wish to know things are getting better
Comentário do autor: "Fiz em Londres. Gosto da sequência 'beta, beta, beta, Bethânia', que no canto soa como better." (Caetano Veloso. Sobre as Letras. Companhia das Letras, 2003).
4 - If You Hold a Stone (Caetano Veloso)
If you hold a stone, hold it in your hand
If you feel the weight, you’ll never be late
To understand
But if you hold the stone, hold it in your hand
If you feel the weight, you’ll never be late
To understand
If you hold a stone, marinheiro só
Hold it in your hand, marinheiro só
If you feel the weight, marinheiro só
you’ll never be late, marinheiro só
To understand
Mas eu não sou daqui
Marinheiro só
Eu não tenho amor
Eu sou da Bahia
De São Salvador
Eu não vim aqui
Para ser feliz
Cadê meu sol dourado
E cadê as coisas do meu país
Comentário do autor: "A pesquisa ousada de Lygia Clark passara quase sem nota: minha amiga Sônia Castro comentou um dia no ateliê que o abandono total da pintura como a conhecíamos a enchia de dúvidas. Lembro nitidamente a menção da palavra pedra na descrição que Sônia fez do que viu de Lygia numa grande exposição coletiva do MAMB que eu, não sei por quê, não visitei. Parece-me que ela - que estava terminando um quadro abstrato que me parecia belo e que a levava às lágrimas enquanto era pintado - se perguntou se valeria a pena abandonar o óleo, a tela e os pincéis e participar de uma exposição com um "saco plástico cheio de água com uma pedra em cima". É curioso que eu tenha tal lembrança, pois não sei o que poderia Lygia estar expondo em Salvador em 63-4. Acho que a frase de Sônia era uma espécie de suposição exagerada, mas é curioso que o que Lygia veio a fazer (e que eu homenageei numa canção de 71 - "If you hold a stone") tenha tido tanto a ver com essa descrição." (Caetano Veloso. Verdade Tropical. Companhia das Letras, 1997).
Nota: Caetano e Lygia Clark se conheceram em Paris, quando Caetano estava de passagem durante o exílio. Além de pintora e escultora, Lygia dedicou-se ao estudo da terapia por meio da arte sensorial. Após voltar de Londres, Caetano fez algumas sessões com Lygia. Em relação às suas experiências, Caetano diz: "Eu acompanhava aquilo como quem acompanha a composição de um ritmo. Era um ritmo profundo, misterioso, mas bastante equilibrado, daquelas coisas que ela punha sobre o corpo da gente... do sopro, da aproximação da mão que, às vezes, era quase sem tocar e, às vezes, com um toque. Tudo isso criava realmente como que uma peça a cada vez. Mas ficava com essa consciência de que eu estava tendo uma experiência mais estética do que terapêutica. [...] Mas lembrava que em Paris tinha sido justamente o contrário, que era uma apresentação de trabalho artístico e que tinha me causado uma sensação de experiência psicológica, que era ao mesmo tempo desestabilizadora e talvez sugestiva de alguma coisa, mas que não chegou a se delinear. Mas era como se você estivesse à beira de um insight. Evidentemente, as experiências estéticas têm efeitos psíquicos e até terapêuticos. O que eu quero dizer, é que eu percebia as sessões mais como objetos de arte do que o dia em que fui ver as novas produções artísticas da Lygia em Paris.” Via "Uma terapêutica para tempos desprovidos de poesia", por Suely Rolnik. Acesse aqui.
5 - Shoot me Dead (Caetano Veloso)
Shoot me dead or be good or
Shoot me dead or say that you die for me
Always said, understood and
Always said, understood
And clear to see
Don't waste your time in saying
Don't waste your time in looking for sorrow
I'm as sure of the past as
I'm certain about tomorrow
All I know about you is
All you know about me is misinformation
All we know about death is
All we know about life in the situation
Your eyes try to detect what
Your eyes try to detect in explanations
My eyes are blinded by
The far off look of new expectations
Morena, morena
Morena, morena
Oh! Morena
Oh! Morena
Oh! Morena
Oh! Morena
6 - In the Hot Sun of a Christmas Day (Caetano Veloso, Gilberto Gil)
They are chasing me
In the hot sun of a Christmas Day
But they won't find me
In the hot sun of a Christmas Day
I walk the streets
In the hot sun of a Christmas Day
Everybody's blind
In the hot sun of a Christmas Day
I need my girl
In the hot sun of a Christmas Day
She seems to love me less
In the hot sun of a Christmas Day
Machine gun
In the hot sun of a Christmas Day
They killed someone else
In the hot sun of a Christmas Day
Nota: Aqui, Caetano pode ter retomado o episódio mais tenso de sua prisão, como descreveu em "Verdade Tropical", 1997. Chamado para fora de sua cela acompanhado por um soldado armado com uma metralhadora, Caetano achou que seria executado, antes de descobrir que na verdade teria seus cabelos cortados.
7 - Asa Branca (Luiz Gonzaga, Humberto Teixeira)
Quando olhei a terra ardendo
Qua fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação
Que braseiro, que fornalha
Nem um pé de prantação
Por farta d'água perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão
Inté mesmo a asa branca
Bateu asas do sertão
Intonce eu disse "adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração"
Hoje longe muitas léguas
Nessa triste solidão
Espero a chuva cair de novo
Para mim vortar pro meu sertão
Quando o verde dos teus olhos
Se espalhar na prantação
Eu te asseguro não chore não, viu
Que eu vortarei, viu
Meu coração
Comentário de Caetano: "Eu tinha gravado a Asa Branca naquele Lp que fiz em Londres. (Aliás é a
única faixa de que eu gosto. Eu acho aquele disco muito enjoado) [...]". (Caetano Veloso. Caetano canta A Volta da Asa
Branca de Luiz Gonzaga. Encarte. Disco de bolso, número 2. Rio de Janeiro, 1972).
Comentário de Luiz Gonzaga: "Uma vez eu estava em Fortaleza, ia passando, lá, numa rua muito
movimentada, e eu vi uma loja de discos. Quando o vendedor, que estava
na porta, me viu, disse: - Luiz, vem cá! Você já ouviu a “Asa Branca”
interpretada por Caetano Veloso em Londres? Eu digo: - Não! – Então vem
cá que eu vou te mostrar! Aí, ele pegou o disco e me entregou a capa, eu
fiquei olhando, e ele botou o disco na... na eletrola. Só em ver a capa eu já
fiquei emocionado, porque ele estava numa tristeza incrível, com um
agasalho branco e muito triste mesmo. Aí, eu comecei a me emocionar
ali. Quando ele começou a fazer a gemedeira do cantador nordestino. Aí eu chorei, pro povo vendo, ali
na loja. Chorei mesmo, emocionado".
Luiz Gonzaga e Caetano Veloso.
Ficha Técnica
Produced by Lou Reizner and Ralph Mace.
Recorded at Chappell's Studios, London.
Engineers: John Timperley and John Iles.
All songs published by GAPA/FAMOUS CHAPPEL except ASA BRANCA which is BRITICO
Strings arrangements (*) by Phil Ryan.
Cover design by Linda Glover (Design Machine).
Photographs by Johnny Clamp.