1986 - Caetano Veloso - Disco Americano


Caetano Veloso (1986) foi lançado nos Estados Unidos pelo selo Nonesuch Digital, a convite do produtor Bob Hurwitz, que gostou do que viu no show Uns em Nova Iorque. O disco com voz, violões e percussão foi gravado ao vivo, sem ensaios, por dois dias. Além das queridas O Leãozinho, Odara e Terra, Caetano retoma Saudosismo e Coração Vagabundo; e apresenta suas versões de Billie Jean e Get Out of Town. O álbum que chama a atenção pela qualidade do som começou a ser vendido no Brasil em 1990, gerando a turnê de divulgação "Caetano Veloso Acústico". 

Caetano: "Este foi lançado em 1986 nos Estados Unidos, todo acústico. Tem um repertório parecido com o de Totalmente Demais, sem os defeitos, porque foi gravado num estúdio maravilhoso de Nova Iorque." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1991). 

"Os dois elepês vão se completar, creio. É mais ou menos como o prédio do Congresso em Brasília, uma parte voltada para dentro e outra para fora. O disco dos Estados Unidos, que não será lançado lá comercialmente nem vai concorrer no mercado das rádios americanas, seria a parte convexa, mostrando o que está na superfície. O da "Luz do Solo" é a parte côncava, buscando o que há dentro de nós." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 1985).

"Eu tenho mesmo um carinho especial por ele. Acho que o LP tem muita beleza. Gosto do som da sala onde ele foi gravado. A gente acabava de dar a última nota e ficava em silêncio, até o som morrer na sala. O silêncio desse disco não tem em nenhum outro trabalho meu. Infelizmente, eu não estava preparado como cantor. Minha voz não está límpida. Eu deveria ter sido um pouco mais João Gilberto." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 1990). 

"Sou capaz de cantar bonito, apesar de não ser muito bom de música. Este disco é lindo e o lugar onde gravamos (o Vanguard Studio, em Nova Iorque) deu uma sonoridade muito mais bonita do que a da minha voz ao natural." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990). 

"Fui fazer o show Velô em Nova Iorque, e o Bob Hurwitz, dono da Nonesuch, quis aproveitar que eu ia estar lá esses dias e sugeriu da gente gravar. Os arranjos foram feitos lá, entre o hotel e o estúdio, não tinham nada a ver com o show Velô e nem com o 'Luz do Solo’. Gravamos como se fosse ao vivo, mas aí voltei pro Brasil e fiz um show. Eu nem havia ouvido direito, pois nem sabia que ia virar disco. E tudo meio mal tocado, eu erro letra. Mas toda vez que eu gravo de voz e violão, faz sucesso! Se eu quisesse ganhar dinheiro, eu ia fingir ser esse cara que faz show de voz e violão! Eu quero fazer show de violão, mas quero trabalhar pra isso." (Depoimento para a Coleção Caetano Veloso 70 anos, 2012).

"A voz não estava (não podia estar) descansada e o canto não está relaxado e concentrado o suficiente. Mas, comparado com Totalmente Demais, é um luxo de simplicidade. Tem um Cole Porter e um Michael Jackson. O Cole tem beleza até no canto. E o Jackson, embora esbanje suingue da concepção ao fraseado (com o hiperluxuosíssimo auxílio do tamborim de Marçal), contém um erro de letra que me incomoda. Um trecho da canção ficou faltando no encarte do disco de Michael e nem Maurice Hughs (inglês), nem Arto Lindsay (americano) conseguiram decifrar o que ele dizia pela audição do disco. Acho que era "she said my baby we danced till three" e nós tínhamos chegado a "she said my baby, best of three", e assim eu gravei. Mas tem as maravilhosas frases de Toni Costa que homenageia Perinho Albuquerque (ouçam minha velha gravação de Eleanor Rigby). Cá Já é uma jóia instrumental com um canto que não atrapalha. Terra rivaliza com a linda gravação original, às vezes com grande vantagem. Enfim, tudo é de uma delicadeza e riqueza de nuances que eu me orgulho de poder lançar este disco agora no Brasil. Como novo. É novo. O Pulsar está lá dizendo que há de voltar muitas vezes. E Odara, que não ia entrar, aparece até pelo avesso. E Saudosismo, de que eu nem me lembrava (acho que foi um pedido de Marcelo), é uma perfeita tradução de alguma coisa que não sei bem o que é, mas que tem a ver com este disco ser um permanente rondar o mundo de João Gilberto, e um permanente fugir-lhe, não por defesa de alguma coisa minha própria, mas por respeito redobrado pela própria coisa dele que é preciso cuidar para que não seja substituído por versões facilitadas e açucaradas (vejo em mim o risco de ser puxado para isso). Como existe João, e para que não se esqueça isso, este é um disco de rock and roll. Sem aspas." (Caetano Veloso para o Correio da Bahia, 1990).


Foto: Folha de S. Paulo.

Caetano Veloso, vocals and guitar

Toni Costa, additional guitar on Ca Já,
Billie Jean, Get Out of Town and Terra,
additional voice on Pulsar.
Marcelo Costa, percussion
Armando Marcal, percussion

Lista de Músicas

S I D E  O N E

1 - Trilhos Urbanos
(Caetano Veloso)

2 - O Homem Velho
(Caetano Veloso)

3 - Luz do Sol
(Caetano Veloso)

4 - Ca Já
(Caetano Veloso)

5 - Medley: Dindi
(Antonio Carlos Jobim and Aloysio de Oliveira)
+
Eu Sei Que Vou Te Amar
(Antonio Carlos Jobim and Vinicius de Moraes)

6 - Medley:
Nega Maluca
(Fernando Lobo and Ewaldo Ruy)
+
Billie Jean (Michael Jackson)
+
Eleanor Rigby
(Lennon / McCartney)

7 - O Leãozinho
(Caetano Veloso)

S I D E  T W O

1 - Coração Vagabundo
(Caetano Veloso)

2 - Pulsar
(Caetano Veloso, Augusto de Campos)

3 - Get Out of Town
(Cole Porter)

4 - Saudosismo
(Caetano Veloso)

5 - Odara
(Caetano Veloso)

6 - Terra
(Caetano Veloso)

Vamos às Letras.

1 - Trilhos Urbanos (Caetano Veloso)

O melhor o tempo esconde
Longe muito longe
Mas bem dentro aqui
Quando o bonde dava a volta ali
No cais de Araújo Pinho
Tamarindeirinho
Nunca me esqueci
Onde o imperador fez xixi
Cana doce Santo Amaro
Gosto muito raro
Trago em mim por ti
E uma estrela sempre a luzir
Bonde da Trilhos Urbanos
Vão passando os anos
E eu não te perdi
Meu trabalho é te traduzir
Rua da Matriz ao Conde
No trole ou no bonde
Tudo é bom de ver
São Popó do Maculelê
Mas aquela curva aberta
Aquela coisa certa
Não dá pra entender
O Apolo e o Rio Subaé
Pena de pavão de Krishna
Maravilha vixe Maria mãe de Deus
Será que esses olhos são meus?
Cinema transcendental
Trilhos Urbanos, Gal
Cantando o Balancê
Como eu sei lembrar de você

Comentário do autor: "Esta eu tinha certeza que queria gravar. Sabia que Trilhos Urbanos abriria o disco, porque seria uma apresentação minha, um cartão de visitas. Tinha que começar por Santo Amaro da Purificação, por onde tudo começou." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

2 - O Homem Velho (Caetano Veloso)

O homem velho deixa a vida e morte para trás
Cabeça a prumo, segue rumo e nunca, nunca mais
O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais
O homem velho é o rei dos animais
A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol
As linhas do destino nas mãos a mão apagou
Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll
As coisas migram e ele serve de farol

A carne, a arte arde, a tarde cai
No abismo das esquinas
A brisa leve traz o olor fugaz
Do sexo das meninas

Luz fria, seus cabelos têm tristeza de neon
Belezas, dores e alegrias passam sem um som
Eu vejo o homem velho rindo numa curva do caminho de Hebron
E ao seu olhar tudo que é cor muda de tom

Os filhos, filmes, ditos, livros como um vendaval
Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal
Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual
Já tem coragem de saber que é imortal

Comentário do autor: "Eu estava fazendo aqui no Brasil o Velô quando gravei este disco em 1985 em Nova Iorque. O Homem Velho era uma canção  do Velô, com banda elétrica. Mas sozinho ao violão ela também se destacava como uma canção muito emocionante até para quem não entende português. Queria uma coisa atual. E como Trilhos Urbanos falava de minha infância, O Homem Velho falaria de minha velhice." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

3 - Luz do Sol (Caetano Veloso)

Luz do Sol
Que a folha traga e traduz
Em verde novo
Em folha, em graça
Em vida, em força, em luz

Céu azul
Que venha até
Onde os pés
Tocam na terra
E a terra inspira
E exala seus azuis

Reza, reza o rio
Córrego pro rio
Rio pro mar
Reza correnteza
Roça a beira
A doura areia

Marcha um homem
Sobre o chão
Leva no coração
Uma ferida acesa
Dono do sim e do não
Diante da visão
Da infinita beleza

Finda por ferir com a mão
Essa delicadeza
A coisa mais querida
A glória, da vida

Luz do Sol
Que a folha traga e traduz
Em verde novo
Em folha, em graça
Em vida, em força, em luz

Comentário do autor: "Esta foi escolhida pela melodia. Pela mesma razão que o Djavan gostou quando ouviu. Tem uma inspiração no tema feito por Nino Rotta para La Strada, o filme de Fellini. Quando o Fabinho Barreto dirigiu o filme Índia, eu quis fazer a música quando vi a foto de Glorinha Pires de índia. Aquela relação dela com um soldado no filme é muito parecida com o La Strada. Esta música tem um pouco daquele gosto musical. Alguns americanos que não entendem a letra acham bonita por causa da melodia." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

4 - Ca Já (Caetano Veloso)

Vejo que areia linda
Brilhando cada grão
Graças do sol ainda
Vibram pelo chão

Vejo que a água deixa
As cores de outra cor
Volta pra si sem queixa
Tudo é tanto amor

Esteja cá já
Pedra vida flor
Seja cá já
Esteja cá já
Tempo bicho dor
Seja cá já
Doce jaca já
Jandaia aqui agora

Ouço que tempo imenso
Dentro de cada som
Música que não penso
Pássaro tão bom

Ouço que vento, vento
Ondas asas capim
Momento movimento
Sempre agora em mim

Esteja cá já
Pedra vida flor
Seja cá já
Esteja cá já
Tempo bicho dor
Seja cá já
Doce jaca já
Jandaia aqui agora

Comentário do autor: "Por que é uma música da qual o Milton Nascimento gosta muito e eu tinha feito mesmo para que um dia ele viesse a gostar. Ele é tão querido lá fora que logo me lembrei desta canção. Tem ainda um compasso cinco por quatro, ou cinco por oito. É fascinante tocar com a percussão. E como ela é em cinco compassos apresenta mais serviço. Porque embora eu seja limitado musicalmente, às vezes faço uma coisa mais complexa, para não parecer que eu faço só coisas bobas." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

5 - Medley: Dindi (Antonio Carlos Jobim and Aloysio de Oliveira)

Céu, tão grande é o céu
E bandos de nuvens que passam ligeiras

Eu Sei Que Vou Te Amar (Antonio Carlos Jobim and Vinicius de Moraes)

Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar
A cada despedida
Desesperadamente
Eu sei que vou te amar
E cada verso meu será
Pra te dizer que eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida
Eu sei que vou chorar
A cada ausência tua eu vou chorar
Mas cada volta tua há de apagar
O que essa tua ausência me causou
Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver
À espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida

Comentário de Caetano: "Eu ainda morava na Delfim Moreira quando eu tocava Eu Sei Que Vou Te Amar e a Suzana de Moraes, minha amiga e filha do Vinicius, gostava muito. Toda vez que eu cantava, os auditórios vinham abaixo. Depois eu cantava uma oitava acima e me emociono muito até hoje. Várias pessoas de todo o mundo se emocionam. Aí tinha que ter um Tom Jobim..." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

6 - Medley: Nega Maluca (Fernando Lobo and Ewaldo Ruy)

Tava jogando sinuca uma nega maluca
Me apareceu
Vinha com um filho no colo
Dizendo pro povo que o
Filho era meu

Billie Jean (Michael Jackson)

She was more like a beauty queen
From a movie scene

I said don't mind
But what do you mean
I am the one
Who will dance on the floor in the round

She said I am the one
Who will dance on the floor in the round

She told me her name was Billie Jean
As she caused a scene

Then every head turned
With eyes that dreamed of being the one
Who will dance on the floor in the round

People always told me:
- Be careful what you do
- And don't go around breaking young girl's hearts

And mother always told me
- Be careful of who you love
- Be careful of what you do
- Cause the lie becomes the truth

Billie Jean is not my lover
She's just a girl
Who claims that I am the one
But the kid is not my son

She says I am the one
But the kid is not my son

For forty days and for forty nights
The law was on her side
But who can stand
When she's in demand her schemes and plans

On the floor in the round

So take my strong advice
Just remember to always think twice
(Do think twice)

She told
- My baby that's a threat
And she looked at me

And showed a photo
My baby cries
His eyes would like mine

Dance it on the floor in the round

(Yes) People always told me:
- Be careful of what you do
- Don't go around breaking young girl's hearts

She came and stood right by me
Then the smell of sweet perfume
Then happened much too soon
As she called me to her room

Billie Jean is not my lover
She's just a girl
Who claims that I am the one
But the kid is not my son

 Eleanor Rigby (Lennon / McCartney)

Ah, look at all the lonely people
Ah, look at all the lonely people
Ah, look at all the lonely people
Ah, look at all the lonely people

Comentário de Caetano: "Ouvi Billie Jean quando saiu o Thriller e comecei a chorar de emoção. Quando consegui entender a letra sussurrada por Michael Jackson, vi que era a história de Nega Maluca. E logo com o Michael Jackson, veja só. E, como diz o Carlos Fernando, do Nouvelle Cuisine, já que ele escreveu, por que não posso cantar?" (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

7 - O Leãozinho (Caetano Veloso)

Gosto muito de te ver leãozinho
Caminhando sob o sol
Gosto muito de você leãozinho
Para desentristecer leãozinho
O meu coração tão só
Basta eu encontrar você no caminho

Um filhote de leão raio da manhã
Arrastando o meu olhar como um ímã
O meu coração é o sol pai de toda cor
Quando ele lhe doura a pele ao léu

Gosto de te ver ao sol leãozinho
De ter ver entrar no mar
Tua pele tua luz tua juba
Gosto de ficar ao sol leãozinho
De molhar minha juba
De estar perto de você e entrar NUMA

Comentário do autor: "Esta é óbvia. É minha assinatura. Os produtores, o Carlinhos Sion e o Bob Hurwitz, sempre opinavam, mas esta era uma obviedade. É uma canção bem tola e simples. Mas o Milton Nascimento gosta muito." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

8 - Coração Vagabundo (Caetano Veloso)

Meu coração não se cansa
De ter esperança
De um dia ser tudo o que quer
Meu coração de criança
Não é só a lembrança
De um vulto feliz de mulher

Que passou por meus sonhos
Sem dizer adeus
E fez dos olhos meus
Um chorar mais sem fim
Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim
Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim

Meu coração não se cansa
De ter esperança
De um dia ser tudo o que quer
Meu coração de criança
Não é só a lembrança
De um vulto feliz de mulher
Que passou por meus sonhos
Sem dizer adeus
E fez dos olhos meus
Um chorar mais sem fim

Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim
Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim

Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim
Meu coração vagabundo
Quer guardar o mundo
Em mim

Comentário do autor: "Das minhas músicas esta é uma das mais antigas e mais resistentes. É a velha (1966) que mais gosto sem mudar de opinião há muito tempo. Todas as outras são insuficientes. Esta e Terra são uma das mais resistentes. Sampa eu fiz para cantar uma única vez na TV, num depoimento sobre São Paulo. Agora, até o João Gilberto gravou e Os Cariocas, gente de música, escolheram ela para gravar. Você veja então que eu não entendo nada de música." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

9 - Pulsar (Caetano Veloso, Augusto de Campos)

Onde quer que você esteja
Em Marte ou Eldorado
Abra a janela e veja
O pulsar quase mudo
Abraço de anos-luz
Que nenhum sol aquece
E o oco escuro esquece

Comentário de Caetano: "É uma do Velô, um poema do Augusto de Campos. Quando eu fiz, logo achei muito simplória e, à medida que o tempo passou, ela me parecia ainda simplória. No entanto, não encontrava uma solução e descobri que não seria sensato encontrar uma solução. Hoje reconheço que ela é uma bela solução." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

10 - Get Out of Town (Cole Porter)

Get out of town
Before it's too late, my love
Get out of town
Be good to me, please

Why wish me harm?
Why not retire to a farm?
And be contented to charm
The birds of the trees

Just disappear
I care for you much, too much
And when you're near, close to me, dear
We touch too much

The thrill when we meet is so bittersweet
That, darling, it's getting me down
So on your mark get set
Get out of town

Comentário de Caetano: "Sou louco por Cole Porter. Quando fiz o primeiro show nos Estados Unidos, cantei It's Lovely. Contei uma história verídica de que Cole Porter compôs esta música aqui, no seu iate na Baía de Guanabara. E a plateia lá morreu de rir, mas é verdade. Só não posso provar. Aí resolvi gravar uma outra de Cole Porter e talvez esta seja a mais bonita do disco." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

11 - Saudosismo (Caetano Veloso)

Eu, você, nós dois
Já temos um passado, meu amor
Um violão guardado
Aquela flor
E outras mumunhas mais
Eu, você, João
Girando na vitrola sem parar
E o mundo dissonante que nós dois
Tentamos inventar tentamos inventar
Tentamos inventar tentamos

A felicidade a felicidade
A felicidade a felicidade
Eu, você, depois
Quarta-feira de cinzas no país
E as notas dissonantes se integraram
Ao som dos imbecis
Sim, você, nós dois
Já temos um passado, meu amor
A bossa, a fossa, a nossa grande dor
Como dois quadradões

Lobo, lobo bobo
Lobo, lobo bobo
Eu, você, João
Girando na vitrola sem parar
E eu fico comovido de lembrar
O tempo e o som
Ah! Como era bom
Mas chega de saudade
A realidade é que
Aprendemos com João
Pra sempre
A ser desafinados
Ser desafinados
Ser desafinados
Ser

Chega de saudade
Chega de saudade
Chega de saudade
Chega de saudade

Comentário do autor: "O baterista Marcelo Costa escolheu Saudosismo e o guitarrista Toni Costa queria Odara. Bob Hurwitz queria ouvir as duas, mas se apaixonou por Saudosismo. Depois, ouviu e gostou de Odara." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

12 - Odara (Caetano Veloso)

Deixa eu dançar pro meu corpo ficar odara
Minha cara minha cuca ficar odara
Deixa eu cantar que é pro mundo ficar odara
Pra ficar tudo jóia rara
Qualquer coisa que se sonhara
Canto e danço que dara

16 - Terra (Caetano Veloso)

Quando eu me encontrava preso
Na cela de uma cadeia
Foi que eu vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim, coberta de nuvens

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Ninguém supõe a morena
Dentro da estrela azulada
Na vertigem do cinema
Mando um abraço pra ti
Pequenina
Como se eu fosse o saudoso poeta
E fosses à Paraíba

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Eu estou apaixonado
Por uma menina, terra
Signo de elemento terra
Do mar se diz: Terra à vista
Terra para o pé, firmeza
Terra para a mão, carícia
Outros astros lhe são guia

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Eu sou um leão de fogo
Sem ti me consumiria
A mim mesmo eternamente
E de nada valeria
Acontecer de eu ser gente
E gente é outra alegria
Diferente das estrelas

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

De onde nem tempo, nem espaço
Que a força mande coragem
Pra gente te dar carinho
Durante toda a viagem
Que realizas no nada
Através do qual carregas
O nome da tua carne

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Nas sacadas dos sobrados
Da velha São Salvador
Há lembranças de donzelas
Do tempo do Imperador
Tudo, tudo na Bahia
Faz a gente querer bem
A Bahia tem um jeito

Terra, Terra
Por mais distante
O errante navegante
Quem jamais te esqueceria?

Comentário do autor: "Acho uma bela canção. Gosto da música e gosto da letra. A primeira gravação é deslumbrante e, no entanto, esta gravação é tão bela quanto a primeira (LP Muito, 1978). Tem alguns aspectos ainda mais belos, por causa da magia do som da sala, toda acústica, lá de Nova Iorque (o Vanguard Studio). Era uma sala de uma antiga loja maçônica, com um pé direito muito alto. Hoje já não existe mais. Ficou um som de uma pureza, de uma clareza que eu adoro. Faz jus à canção e à primeira gravação. É uma canção tão longa e eu nem me aborreço com ela." (Caetano Veloso para o Jornal do Brasil, 1990).

Ficha Técnica

Produced by Robert Hurwitz
Executive Producer: Carlos Alberto Sion
Recorded September 1985,
at Vanguard Studios, NYC
Engineer: John Newton
Digital editing: Tim Geller
Art direction and design: Carin Goldberg
Cover photograph by Joel Meyerowitz
Lyrics enclosed
with translations by Arto Lindsay

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