Verdade tropical (1997) - Caetano Veloso


Verdade tropical é uma espécie de autobiografia em que Caetano Veloso disserta sobre suas diversas influências artísticas desde a infância, ensaios e memórias da carreira, a experiência do tropicalismo e a vivência da prisão e do exílio. Um artigo escrito por Caetano e publicado no The New York Times sobre Carmen Miranda levou a um convite feito por George Andreous, da editora americana Knopf, para que o cantor escrevesse um livro sobre a cultura "underground" no Brasil dos anos 60. Verdade tropical foi lançado em 1997, editado pela Companhia das Letras. Vinte anos depois, a publicação foi reeditada ganhando um novo capítulo: "Carmen Miranda não sabia sambar". 

Caetano escreve "Verdade Tropical" (1996). Foto: Pedro Agilson.



Texto da contracapa: "Do fundo escuro do coração solar do hemisfério sul, de dentro da mistura de raças que não assegura nem degradação nem utopia genética, das entranhas imundas (e, no entanto, saneadoras) da internacionalizante indústria do entretenimento, da ilha Brasil pairando eternamente a meio milímetro do chão real da América, do centro do nevoeiro da língua portuguesa, saem estas palavras que, embora se saibam de fato despretensiosas, são de testemunho e interrogação sobre o sentido das relações entre os grupos humanos, os indivíduos e as formas artísticas, e também das transações comerciais e das forças políticas, em suma, sobre o gosto da vida neste final de século." 

Texto da editora: Nesta Verdade tropical, o centro da atenção de Caetano Veloso é o tropicalismo - seus pontos de partida afetivos e intelectuais; seus protagonistas; o modo como foi percebido por uma geração que cantava música popular apaixonadamente, como quem toma partido; as visões do Brasil delineadas a partir dele; as formas que encontrou de se desdobrar ao longo do tempo. Mas Caetano fala diretamente de si mesmo, transformando a relação com a música num roteiro de sua vida pessoal. Assim, no capítulo "Narciso em férias”, ele relembra os dois meses em que ficou preso, na passagem de 68 para 69. Conta, por exemplo, como teve a chance de evitar a prisão de Gilberto Gil e não soube fazê-
lo; descreve seu sono irremediável e o modo como vivenciou o erotismo naquele confinamento entre homens; explica as tais fotografias da Terra que viu numa revista de variedades; narra sem pressa uma situação que hoje lhe inspira “um misto de humor e nojo": no pátio do quartel dos pára-quedistas, sob “um sol brutal, com um cano de metralhadora às costas, eu cantava suavemente para o oficial de dia”. Caetano estende uma linha cronológica a partir da infância e da adolescência em Santo Amaro, e, embora se concentrando no período que vai até meados da década de 70, chega até o momento em que terminou de escrever este livro, em julho de 97. De um extremo ao outro os temas se multiplicam: as relações familiares; a ditadura, o exílio em Londres; leituras decisivas e preferências literárias; o sexo, a experiência com as drogas; Gil, Bethânia e Gal; João Gilberto e a bossa nova; rock'n'roll e samba; Chico Buarque; Glauber, Cinema Novo e amor ao cinema; projetos estéticos das décadas de 60 e 70; os festivais e os programas de auditório, a velha Record; o teatro de Zé Celso e o de Boal; o diálogo com os concretistas; a contracultura de Zé Agrippino; Beatles e Mutantes; Rio, São Paulo e Salvador, etc. Sem ser uma autobiografia, Verdade tropical é Caetano Veloso por ele mesmo. Pode ser a MPB por ela mesma ou nossos trópicos por um tropicalista, por um brasileiro músico, por um compositor brasileiro que aqui faz do tempo a torre mais alta do seu observatório. É a primeira vez que ele usa longamente a
escrita. De muitas maneiras, entretanto, conhecemos de perto o autor de Verdade tropical: suas canções misturam-se às nossas experiências, traduzem nossa vontade de amor e de protesto, sugerem o tom e o pulso de certas danças ocultas dentro de nós. Neste livro está intacta sua capacidade de nos provocar, de nos pôr em movimento com seu ouvido inquieto, com a vitalidade de sua imaginação reflexiva, com uma forma própria de falar a língua portuguesa.

"Enquanto escrevia este livro, pensei em chamá-lo “Boleros e civilização”, um velho trocadilho meu de 1968 (que estaria na contracapa de um disco que não fiz porque a prisão interrompeu meus planos de composição), como piada com o famosíssimo título “Eros e civilização”, de Marcuse. Mas o editor americano me disse que nos Estados Unidos ninguém pensava em Marcuse. Outro título que imaginei foi Meu tropo — que agora ganha novo encanto por causa do artigo de Camillo Penna. Recentemente encontrei, no Google, referências a um livro de epistemologia intitulado “Tropical Truth(s)”. É um estudo sobre os tropos, as figuras de linguagem, e sua relação com a verdade. Pois bem, meu livro, finalmente nomeado a partir do bolero “Vereda tropical”, é meu tropo, minha monstruosa metáfora (ou metonímia?), a adjetivar sua própria verdade. Antonio Cicero tinha gostado do título “Verdade tropical” justamente por a expressão poder ser tomada como semelhante a “verdade meridiana” ou “verdade solar”. Vinte anos depois, VT me parece menos respeitável como um livro entre livros do que pôde parecer a Roberto Schwarz, embora eu ache graça em muitos aspectos da minha prosa e reconheça haver nele mais verdade do que o crítico supõe. Há a verdade do meu tropo, ou a tropicalidade da verdade da minha vereda. Quando ele saiu, lancei um disco de que gosto mais criticamente do que de Fina estampa, embora o ache bem menos agradável de ouvir: chamei-o de Livro." (Caetano Veloso em rede social, 2017). 

Índice

Carmen Miranda não sabia sambar

Intro

Parte 1
    Elvis e Marilyn
    Bethânia e Ray Charles
    Intermezzo baiano

Parte 2
    Transe
    Paisagem útil
    Domingo
    Baihunos
    Alegria, alegria
    Domingo no parque
    Tropicália
    2002
    A poesia concreta
    Chico
    Vanguarda
    Antropofagia
    Panis et circensis
    É proibido proibir
    Divino, maravilhoso

Parte 3
    Narciso em férias

Parte 4
    Barra 69
    London, london
    Língua
    Afinidades eletivas
    Ame-o ou deixe-o
    Back in Bahia
    Araçá azul

Vereda

Edição comemorativa do livro "Verdade tropical" (2017).

Referência bibliográfica: Veloso, Caetano. Verdade tropical / Caetano Veloso. - São Paulo : Companhia das Letras, 1997. 

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