Jon Hendricks
Soube que Jon Hendricks morreu. Ele tinha 96 anos. Foi considerado o maior cantor de jazz de todos os tempos. Inventou o scat singing. Transpôs para voz obras instrumentais emblemáticas. E, coisa de que quase ninguém fala, gravou, no começo dos anos 1960, um disco todo em homenagem a João Gilberto. "o inventor da bossa nova". O título do disco, "Salud!", indica o antigo desconhecimento por parte dos americanos de que falamos português. A arte gráfica da capa do LP também sugere distância do que realmente era a música de João. Mas não as faixas de Jon. Estas, com repertório extraído dos primeiros (e divinos) discos que João Gilberto gravou a partir de 1968, são traduções musicais completas e profundas do que João fazia. E do que significavam os arranjos de Jobim e de Walter Wanderley. Quem me mostrou foi Moreno, que é quem me ensinou desde sempre, com sua mera existência, as coisas mais importantes da vida, e, ao longo dos anos, em conversas, foi me ensinando mais e mais. Quero, hoje, saudar Moreno, João e Jon. De nada adianta João Gilberto sumir, fugir, ser despejado ou o que quer que ele faça ou façam com ele: a imensidão de sua obra insiste em agir neste mundo. Jon esteve em Minas faz uns anos. Nada li na imprensa brasileira, que noticiou sua vinda, sobre sua pesquisa joãogilbertiana pioneira e apaixonada. Moreno já tinha me dado a luz. Hoje, rezo para que João viva ainda mais do que viveu Jon. Com tempo para tudo ficar no lugar certo. Moreno Veloso me ajuda.
Caetano Veloso, 24/11/2017.