2021 - Meu Coco - Caetano Veloso
Caetano Veloso lançou no dia 21 de outubro de 2021 o seu novo álbum de inéditas após nove anos, intitulado Meu Coco. A ideia do disco surgiu ainda no final de 2019, depois da faixa-título ser composta ao se pensar na relação entre música e o Balé Folclórico da Bahia. Num vídeo publicado nas redes sociais, Caetano anunciou o projeto: "são canções que representam como está minha cabeça hoje no sentido da capacidade de produzir canções”. O disco saiu pela Sony Music.
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Caetano: "A canção que dá título ao álbum diz tudo: Meu coco. Ou seja, é tudo o que passa na minha cabeça. Assim, é uma mirada atual sobre temas recorrentes em meu trabalho: nomes, fantasias que esboçam uma decifração do Brasil, homenagens a meus amores. Curiosamente, tudo isso que parecia um balanço do que tenho feito ao longo de décadas terminou se revelando um amontoado de novidades, de peças formais e olhares sobre as coisas que são diferentes de tudo o que já fiz. Tudo almejava ser reiteração, mas virou mudança de perspectiva. O estúdio já existia. Paulinha tinha encomendado a construção de um na casa da Niemeyer, que ficou pronto antes do anúncio da pandemia. Eu ia esperar a pandemia acabar para fazer o disco, que tinha começado a imaginar em 2019. Como ainda hoje não acabou, depois de um ano esperando, decidi gravar nesse estúdio meio caseiro, embora de nível profissional. Lucas Nunes, colega de Tom na banda Dônica, me ajudou a fazer tudo. Primeiro, só nós dois. Logo fomos chamando Márcio Victor, Vinícius Cantuária, Marcelo Costa, Mestrinho, Hamilton de Holanda, e encomendando arranjos a Thiago Amud, Jaques Morelenbaum e Letieres Leite, que gravaram orquestras à distância. E Pretinho da Serrinha, para quem compus um samba especial, que gravou com músicos com quem costuma tocar." (Caetano Veloso em entrevista para a revista Elle, 2021).
"O disco é todo de afirmação, mas está, na verdade, dentro de um momento de negação do que pode haver de bonito no Brasil. Embora não haja um tom irônico explícito no disco, a situação em si contém uma ironia. Eu, primeiro, não pensei necessariamente em percussão. Podia ser até eletrônico, tanto que a levada da canção Meu Coco é dura, propositadamente dura, com um corte do riff rítmico. Eu tinha vontade de fazer um negócio que soasse estranho. Terminou a percussão tendo uma presença maior. Ficou mais parente do Noites do Norte do que do disco mais artificioso que eu pensava em fazer antes da pandemia começar." (Caetano Veloso para a Folha de S.Paulo, 2021).
"A canção Meu coco, que dá nome ao disco, traz essa afirmação da pluralidade brasileira, da nossa rica e confusa beleza. Na música Não vou deixar, digo: 'Não vou deixar porque eu sei cantar e sei de alguns que sabem mais, muito mais'. Ou seja, a força da canção popular brasileira, do que o Brasil tem de bonito, se sobrepõe e sobreporá aos horrores pelos que a gente vem passando. Jamais diria que é dedicada a ele (Bolsonaro), mas aquilo está dito a pessoas como ele, a ele, ao tipo de poder que representa, sim. É o Brasil dizendo: 'Não vou deixar você esculachar com a nossa história'. Há um paralelo com Transa no sentido da saudade. Porque aparece um Brasil muito vivo e também referido em seus detalhes. Transa é cheio de pedaços de canções de outros. As referências à proliferação de criação musical que acontece no Brasil desde tanto tempo aparece aqui de novo sentida como saudade, festejada, celebrada, mas de um ponto de vista de quem está no meio de um período horrível. Eu vinha compondo com muita excitação e inspiração antes da pandemia. Muitas ideias, desejo de fazer e fluência na feitura. Quando começou a pandemia e tive que ficar parado aqui, baixou meu galho, demorei a retomar a capacidade de compor. Mas terminei indo em frente e completei o repertório. Não vou deixar, Anjos tronchos e Ciclamen do Líbano compus na pandemia. Muitas outras, no final de 2019 e verão de 2020. Achei que fosse esperar só uns meses, mas acabou sendo mais de um ano. Gravei nesse estúdio pequenininho aqui de casa, que a Paulinha (Lavigne, sua companheira) construiu. Ela nem imaginava que ia ter pandemia... Tem uma coisa curiosa: é o primeiro disco em toda a minha carreira que só tem canções minhas, sem parceiros. Todas as letras e músicas são minhas. Isso é o que mais resultou da pandemia: o fato de ser exclusivamente meu o repertório." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 2021).
"Imaginava [para o disco] pesquisar mais com Zeca e já tinha a intenção de definir timbre e sotaque da levada de Meu coco a partir de gravações com os dançarinos do Balé Folclórico da Bahia. A feitura do disco começaria junto com a feitura do primeiro clipe, que seria o dessa canção. Preso no Rio, adiei tudo sem saber para quando. Demorei a voltar a ser capaz de compor. Quando retomei, sem poder começar por ir à Bahia gravar vídeos com a turma do Balé, comecei por ir ao estudiozinho que Paulinha construiu aqui em casa em 2018. Chamei Lucas Nunes (colega da banda de Tom) para fazer o básico comigo (ele é excelente músico e sabe lidar com mesa de gravação). Não sei o que sairia de um disco que começasse por um vídeo e ideias audaciosas assim. Mas Lucas e eu começamos por gravar uma base para Meu coco e fomos chamando Marcio Victor, Vinicius Cantuária, Marcelo Costa pra fazer percussão, cada um de uma vez, com teste e máscara. Depois Jaquinho, Letieres e Thiago Amud. Este, como é o mais novo, merece comentário especial: o arranjo que ele escreveu para Meu coco tem a beleza dos textos das letras que ele escreve, das melodias e harmonias que ele estrutura e das orquestrações que ele faz para suas canções próprias canções." (Caetano Veloso para o UOL, 2021).
"O que veio a ser Meu Coco se desenvolveu a partir de conversas com Zeca, que é meu conselheiro na observação do que se passa na música hoje, aqui e no mundo. Os três [Moreno, Zeca e Tom] cantam o "Zabé" do final da canção título comigo; Moreno fez toda a percussão de candomblé de Gilgal e Tom toca violão comigo em Autoacalanto." (Caetano Veloso para o UOL, 2021).
"Comecei a pensar em gravar um novo álbum autoral no verão de 2019. A música Meu Coco veio até mim como o início do projeto. Tinha composto Pardo para Céu cantar e comecei novas canções. Eu disse que já escrevi músicas demais e que compor novas é um sinal de falta de rigor crítico. Mas eu amo músicas desde a infância, e amar músicas é amar a vocação para quantidade, proliferação. Senti a necessidade emocional de fazer um álbum com inéditas." (Caetano Veloso para o El País, 2021).
"Senti necessidade quase física de fazer um disco com novas canções. Principalmente depois que fiz Meu Coco, a canção. E fui em frente. [...] Não foi planejado, mas é claro que tive consciência da frequência alta de nomes da minha geração e da história da nossa música. Devo isso a ter feito a canção Meu Coco. Nomes são uma constante em meu trabalho, desde sempre. Uma das minhas primeiras músicas, anterior a Coração Vagabundo, tem Brigitte, Belmondo, Orlandivo, João Gilberto… Em Meu Coco nomes voltaram a ser o centro da conversa. Daí vieram Enzo Gabriel e Gilgal (nesta, desde o título) e a lista de Sem Samba não dá. Quando essas coisas já estavam feitas, li a letra e ouvi a canção nova de Bob Dylan e achei graça da coincidência. As novas dele são lindas. E, claro, ele também tem uma obra cheia de nomes. Adoro nomes. (Caetano Veloso para a IstoÉ, 2021).
"Eu descia a escada com o Lucas Nunes, que fez o disco comigo. No princípio, éramos só os dois. Então chamamos Márcio Victor, Vinicius Cantuária, daqui a pouco Marcelo Costa. Botamos percussões e, depois, os arranjadores que a gente convidou pra fazer gravação de orquestra, fosse na Bahia, em Belo Horizonte, no Rio. Mas tudo se passava lá em casa. É diferente, sim. Termina saindo mais... [Mais intimista?] De certa forma, sim. Em casa, todas as canções com letra e música minha, acho que fica de certa forma mais íntimo. Eu estava planejando fazer um disco em que eu teria Zeca, meu filho do meio, como conselheiro. E através das conversas com ele, chegaríamos ao estúdio e aos músicos e aos técnicos adequados. Já tinha essa música Meu Coco e algumas outras, mas aí parei tudo porque não dava pra gravar. Quando retomei, sozinho com Lucas no estúdio de casa, foi de uma maneira mais modesta. "Vamos fazer aqui nós dois o que der pra fazer". Mas como o Lucas é muito capaz, a coisa se desenvolveu bastante. Então, a sensação é diferente, foi muito boa. Lucas entende tudo, e, mesmo em coisas que o gosto pessoal não coincidia, ele entendeu e até achou que foi interessante pra ele como treinamento do gosto, aprendizado, respeito de estilos. E, pra mim, também. O resultado acabou tendo uma unidade na variedade que me alegra. O disco é quantitativamente variado e, no entanto, tem um centro, que faz dele um bom disco. Curiosamente, eu nem sabia se conseguiria fazer um disco, e como ia ser. No fim das contas, achei que consegui fazer um bom disco brasileiro. (...) Quando fiz Meu Coco, que é a nave-mãe, de onde saíram as outras e o projeto de fazer o disco, eu pensava em definir um disco mais homogêneo no tratamento dos arranjos, na instrumentação, e encontrar uma sonoridade, um timbre e umas levadas que dessem uma unidade óbvia ao disco. Saiu o contrário. Terminei fazendo um disco com imensa variedade de sons. É curioso que o single seja Anjos Tronchos, que soa como o último disco que fiz, nove anos antes, com a bandaCe. Porque é Pedro Sá tocando e, no entanto, é a única faixa que Pedro Sá participa. Isso dá um retrato do histórico da feitura desse disco. (...) Felicidade intensa, muitas alegrias, e, no fim das contas, um contentamento muito grande por ter conseguido fazer. Porque os amigos vieram, mas um de cada vez. Pouco a pouco, a gente foi somando. Alguns gravaram à distância, as orquestras foram todas à distância. Tudo feito aos poucos. Mas quando foi ficando pronto, eu senti que é um disco com uma consistência, que vale por ele mesmo. Isso me dá realmente uma alegria muito profunda". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Fernando Young.
Caetano e o produtor Lucas Nunes. Foto: Aline Fonseca.
Release
Muitas vezes sinto que já fiz canções demais. Falta de rigor?, negligência crítica? Deve ser. Mas acontece que desde a infância amo as canções populares inclusive por sua fácil proliferação. Quem gosta de canções gosta de quantidade. Do rádio da meninice, passando pela TV Record e a MTV dos começos, até o TVZ no canal Multishow de agora, encanta-me a multiplicidade de pequenas peças musicais cantadas, mesmo se elas surgem a um tempo redundantes e caóticas. Há nove anos que eu não lanço álbum com canções inéditas. No final de 2019, tive um desejo intenso de gravar coisas novas e minhas. Tudo partiu de uma batida no violão que me pareceu esboçar algo que (se eu realizasse como sonhava) soaria original a qualquer ouvido em qualquer lugar do mundo. Meu Coco, a canção, nasceu disso e, trazendo sobre o esboço rítmico uma melodia em que se historia a escolha de nomes para mulheres brasileiras, cortava uma batida de samba em células simplificadas e duras. Minha esperança era achar os timbres certos para fazer desse riff sonhado uma novidade concreta. E eu tinha a certeza de que a batida, seu som e sua função só se formatariam definitivamente se dançarinos do Balé Folclórico da Bahia criassem gestos sobre o que estava esboçado no violão. Com isso eu descobriria o timbre e o resto. Mas chegou 2020, o coronavírus ganhou nome de Covid-19 e eu fiquei preso no Rio, adiando a ida à Bahia para falar com os dançarinos. Esperaria alguns meses?
Passou-se mais de ano e eu, tendo composto canções que pareciam nascer de Meu Coco, precisei começar a gravar no estúdio caseiro. Chamei Lucas Nunes pra começar os trabalhos. Ele é muito musical e também é capaz de comandar uma mesa de gravação. Começamos por Meu Coco, de que Enzo Gabriel é uma espécie de península: seu tema (seu título) é o nome mais escolhido para registrar recém-nascidos brasileiros nos anos 2018 e 2019. À medida que vou fazendo novas canções, me prometo pesquisar a razão de, na minha geração e mesmo antes dela, nomes ingleses de presidentes americanos terem sido escolhidos por gente simples e pouco letrada, principalmente preta, para batizar seus filhos: Jefferson, Jackson, Washington - assim como Wellington, William, Hudson - eram os nomes preferidos dos pais negros e pobres brasileiros. Ainda não fiz nenhum movimento nesse sentido, mas ter esse disco pronto e estar empenhado em lançá-lo me leva a certificar-me de que farei a pesquisa, como se fosse um sociólogo, assim como ter feito Anjos Tronchos, canção reflexiva que trata da onda tecnológica que nos deu laptops, smartphones e a internet, me faz prometer-me ler mais sobre o assunto.
Cada faixa do novo álbum tem vida própria e intensa. Se Anjos Tronchos tem sonoridade semelhante à de Abraçaço, o último disco que fiz antes deste, Sem Samba Não Dá soa à Pretinho da Serrinha: uma base de samba tocada por quem sabe - e a sanfona de Mestrinho, que comenta as fusões de música sertaneja com samba tradicional. Uma discussão sobre o (não) uso da palavra 'você' pela brilhante jovem fadista Carminho virou o fado midatlântico Você-Você, que ela terminou cantando comigo - e ganhou bandolim sábio de Hamilton de Holanda fazendo as vezes de guitarra portuguesa. Há Não Vou Deixar, com célula de base de rap criada no piano por Lucas e letra de rejeição da opressão política escrita em tom de conversa amorosa. Pardo, cujo título já sugere observação do uso das palavras na discussão de hoje da questão racial, teve arranjo de Letieres Leite, baiano, sobre a percussão carioca de Marcelo Costa. Cobre, canção de amor romântico, fala da cor da pele que compete com o reflexo do sol no mar do fim de tarde do Porto da Barra. Jaques Morelenbaum, romântico incurável, veio orquestrá-la. Mas também tratou de Ciclâmen do Líbano, com fraseado do médio-oriente salpicado de Webern. Devo Lucas a meu filho Tom: os dois fazem parte da banda Dônica; devo a atenção a novas perspectivas críticas a meu filho Zeca; devo a intensa beleza da faixa GilGal a meu filho Moreno: ele fez a batida de candomblé para eu pôr melodia e letra que já se esboçava mas que só ganhou forma sobre a percussão. E eu a canto com a extraordinariamente talentosa Dora Morelenbaum.
Este é um disco de quantidade e intensidade. Autoacalanto é retrato de meu neto que agora tem um ano de idade. Tom, o pai dele, toca violão comigo na faixa. A nave-mãe, Meu Coco, guardou algo da batida imaginada, agora com percussão de Márcio Vitor. Mas o arranjo de orquestra que a ilumina foi feito por Thiago Amud, um jovem criador carioca cuja existência diz tudo sobre a veracidade do amor brasileiro pela canção popular. (C.V.)
Foto: Fernando Young
Lista de músicas
1 - Meu Coco
Dedicada a Jorge Mautner, Mércio Gomes e à memória de Manhã de Paula.
2 - Ciclâmen do Líbano
3 - Anjos Tronchos
4 - Não Vou Deixar
5 - Autoacalanto
6 - Enzo Gabriel
7 - GilGal
8 - Cobre
9 - Pardo
10 - Você-você
Participação especial: Carminho.
11 - Sem Samba Não Dá
12 - Noite de Cristal
Todas as letras e músicas foram compostas por Caetano Veloso.
Vamos às Letras.
1 - Meu Coco
Simone Raimunda disparou as Luanas
A palavra bunda é o português dos Brasis
As Janaínas todas foi Leila Diniz
Os nomes dizem mais do que o que cada uma diz.
Somos mulatos, híbridos e mamelucos
E muito mais cafuzos do que tudo o mais
O português é um negro dentre as eurolínguas
Superaremos cãimbras, furúnculos, ínguas…
Com Naras, Bethânias e Elis
Faremos mundo feliz
Únicos, vários, iguais:
Rio-Canaveses.
Belém, Natal, Vitória do Espírito Santo
Bomba luminosa sobre o capital
Aquém, além, no seio do bem e do mal
Teimosos e melódicos no nosso canto
Católicos de axé e neopentecostais
Nação grande demais para que alguém engula
Aviso aos navegantes: bandeira da paz
Ninguém mexa jamais, ninguém roce nem bula
João Gilberto falou
E no meu coco ficou
Quem é, quem és e quem sou?:
“Somos chineses”.
Moreno, Zabelê, Amora, Amon, Manhã
Nosso futuro vê açaí guardiã
Ubirajaras mil, carimã, sapoti,
Virá que eu vi, virá, virá, virá que eu vi
Irene ri, rirá, Noel, Caymmi, Ary
Tudo embuarcará na arca de Zumbi e
Zabé.
Comentário do autor: "No princípio era o ritmo. Tchicum-tchicum. Pensava em dança e deixava nomes rolarem na minha cabeça. Os nomes das brasileiras foram desenhando a nossa história. Misteriosa. João Gilberto dizia coisas como poesia nas conversas. Fazer uma canção que mostrasse o que se passa em minha cuca ao ouvir João falar? Verão em Salvador. Visão dos dançarinos do Balé Folclórico da Bahia. Final de 2019. Nem imaginava o que seria 2020. Pensava nos nomes que dei ao meu primeiro filho. E os que contemporâneos meus deram aos deles." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"O número grande de referências a colegas é uma demonstração de que nós somos pluralmente mais luminosos do que a vida que estamos tendo que levar. O disco é de personagens reais, principalmente, da música brasileira. A canção Meu coco é dedicada a Jorge Mautner. À memória da Manhã de Paula, filha de José Agrippino de Paula, que morreu novinha, adolescente, num acidente de automóvel. E também a Mércio Gomes. Porque li o livro dele, 'O Brasil inevitável', que me influenciou muito. Ficou na minha cabeça e aparece em Meu coco. A frase de Mautner ('ou o Brasil se brasilifica ou vira nazista') faz total sentido. A gente está entre uma coisa e outra bem claramente. Por isso Meu coco é dedicada principalmente a ele." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 2021).
"O refrão ecoa Se todos fossem iguais a você. A batida cortada da primeira parte foi o que me animou a querer gravar novo disco. Quis fazer algo que soasse livre e novo. Ia pesquisar timbres. Conversei muito com meu filho Zeca, que conhece tudo o que rola (e muito da história do que rolou), ele é meu conselheiro. Mas veio a pandemia e tive de ficar parado esperando. A vontade de ser original dominava no nascimento do projeto, antes da pandemia. Depois de um ano, com uma travada na composição nos primeiros meses, pode-se dizer que o que você chama de beleza clássica ficou mesmo disputando espaço com a experimentação." (Caetano Veloso para a IstoÉ, 2021).
"Só o João Gilberto poderia me dizer essa frase ("somos chineses"), e ela se manter tão enigmática quanto quando ela foi dita. Foi quando ele me chamou em 1971 ao Brasil, para vir gravar com ele e Gal. Depois que a gente gravou em São Paulo, viemos para o Rio. Aí, no hotel onde ele estava conversando comigo, falando para caramba, Gal perguntou para João: "Vocês ouviam Chet Baker?". "Ouvíamos, Gracinha. Ouvíamos." "Você gosta?" "Gosto, gosto, mas é muito americano burrão. Americano é muito burrão." Ele falava desse jeito. "Nós somos diferentes, Caîtas. Nós somos chineses." Era uma coisa muito densa, porque tem muita coisa aí. João tinha noção. Ele conversava como se fosse um poeta. Às vezes como um satirista ou um sádico também, dizendo mal de outras pessoas, outros artistas, mestres dele e nossos. Ele podia ser muito mau. Ou muito luminoso. Mesmo quando era mau, era luminoso, porque apresentava com muita graça a deficiência de gênios da música brasileira. Por outro lado, ele falava coisas que eram como que revelações poéticas, porque elas valiam por si. Você não pode traduzir ou meramente explicar. É aquilo. Então, esse "somos chineses" que ele me disse ficou em Meu Coco. É uma canção que tem esse aspecto que você falou. É um samba troncho exaltação. A levada é quebrada. Fizemos eu e Lucas [Nunes] tudo. Lucas tocando baixo e violão. Ele complementou ainda com uma guitarra em cima. Eu tinha pensado em Thiago Amud desde cedo para escrever o arranjo para orquestra. Ele fez brilhantemente, porque ele é um músico incrível. Meu Coco é uma música que rediz algumas coisas que eu venho dizendo ao longo das décadas. Não é uma síntese, é uma cascata de referências rápidas a coisas que eu venho dizendo já em outro patamar, em outro estágio, porque é uma canção que tem um ritmo rápido e muitas palavras. Ela trata principalmente dos nomes que as pessoas dão aos seus filhos no Brasil. Ela até aponta para outra canção que trata só de um nome, o nome mais posto em criança no Brasil em 2019, que é Enzo Gabriel. Ela é uma espécie de samba-exaltação que tem uma gota de autoironia. Meu Coco retoma esse tema da mestiçagem, que de fato aparece na canção Pardo, que está no disco e já foi gravada por Céu. Meu Coco retoma em um tom de exaltação. Como eu estava falando antes, é como se fosse um samba-exaltação, que tem algo de autoirônico na própria forma, no todo, inclusive para que ele não seja um vulnerável samba-exaltação, como tantos outros. Aquarela do Brasil, do Ary Barroso, muitíssimo importantemente, começa por chamar o Brasil de "mulato" logo na abertura: "Brasil, meu Brasil brasileiro, meu mulato inzoneiro". Tem sido ao longo da minha vida o hino nacional brasileiro extraoficial, a música brasileira mais conhecida no mundo, só competindo com "Garota de Ipanema". Essa canção que eu fiz agora, Meu Coco, repete essa exaltação da mestiçagem. Esse "somos mulatos híbridos e mamelucos/ e muito mais cafuzos do que tudo o mais" me veio de um livro que eu li de Mércio Gomes, "O Brasil Inevitável" (Topbooks). Mércio diz que a miscigenação se deu, no fundo, mais entre negros e índios em áreas de pesca. Acho bonito que isso seja um sonho do Mércio ou uma informação sociológica, histórica, precisa. Isso me toca. Porque, na verdade, é um desejo de sublinhar um aspecto da miscigenação que saia do padrão "o senhor branco estupra a escrava negra". Toda a miscigenação seria isso, e tem havido muita discussão em torno disso ao longo do tempo. A gente sabe tudo o que se discutiu sobre "Casa-Grande e Senzala", a reação contra Gilberto Freyre e esse apelido de "democracia racial", que ficou como uma expressão muito atacada. Para mim, não funcionou muito, porque eu acho que a democracia tout court, não a democracia racial, é um mito, mas "o mito é o nada que é tudo". Não é por ser mito que você despreza a ideia de democracia racial. Essa ideia do Brasil como um acontecimento bastante intenso de miscigenação é uma ideia, para mim, muito rica. No livro do Mércio, tem esse negócio do cafuzo, ou seja, de uma liderança negra e indígena na miscigenação maciça do Brasil, por causa dos pequenos aglomerados praieiros ou ribeirinhos ligados à pesca, onde negros e índios se misturaram. Por isso, eu pus "muito mais cafuzos do que tudo o mais" na letra do Meu Coco, entendeu? Eu conheço toda a crítica que se faz à miscigenação e ao mito da democracia racial, mas eu sempre respondi ao longo dos anos que a democracia em si é um mito, nunca realizada em lugar nenhum, e o pouco que se experimenta dela é muito importante. Você ter como horizonte esse mito democrático enriquece a experiência de vida e as forças que se mexem na sociedade. No caso da democracia racial, eu acho que também pode ser vista dessa maneira positiva e não apenas da maneira negativa, um pouco americanizada demais, que cresceu no Brasil nas últimas décadas. Eu respeito muito. Eu acho que o que aconteceu, essa racialização mais americana, enriquece a questão, nos dá mais força para fazer acontecer, e não deve significar uma destruição de tudo o que aconteceu com o Brasil e que pode dizer muito ao mundo. Reaparece na canção Enzo Gabriel como salvação do mundo, o Brasil tendo uma missão de salvar o mundo. Mas aparece de uma maneira meio melancólica na música, que vem quase como um lamento. É como quem está dizendo isso, mas está vivenciando uma grande tristeza. Meu Coco, que é mãe de tudo isso, de Pardo e Enzo Gabriel, tem dentro de si esse reconhecimento da grande tristeza que estamos vivendo. A canção foi feita em 2019. Nós já estávamos nas trevas que se instauraram politicamente no Brasil, em 2018, e sabemos que dificuldades teremos para sair dessas trevas e de atravessar esse período de trevas políticas. Então, a canção poderia ser um pouco vulnerável por parecer otimista, e um otimismo ligado à miscigenação, a coisas que já vinham sendo combatidas por quem tem responsabilidade social e política mais intensa. Isso poderia transformar a canção Meu Coco e tudo que sai dela, o meu disco inteiro, a minha cabeça toda, fazer de tudo isso algo mais vulnerável. No entanto, eu sei que a canção tem uma autoironia violenta e interessante. Eu repito várias coisas que eu disse ao longo das décadas, inclusive terminando por unir, mais uma vez, Zumbi com Zabé, Zumbi com a princesa Isabel. Porque se tem uma coisa com que eu me sinto problemático é com esse desprezo pela figura da princesa Isabel. Eu não gosto disso. Eu acho um empobrecimento da questão da formação da sociedade brasileira de fato. Eu cresci vendo os negros de Santo Amaro e meu pai conosco indo para praça do Mercado, todo ano, celebrar o 13 de Maio. As pessoas cantando em louvor da princesa Isabel e dançando, batidas de candomblé, cânticos, sambas de roda. Ninguém vai arrancar isso de mim." (Caetano Veloso para a Folha de S.Paulo, 2022).
"Ela se deu como uma canção manifesto. Na verdade, comecei pelo ritmo, quis fazer aquela levada, que é meio dura, como se fosse um pedaço de uma célula do samba cortada e repetida. Não é dura, o corte é duro, o resultado não é. Queria fazer essa célula ritmica e encontrar um timbre que desse a ela uma vitalidade moderna e livre, inventiva. E terminei procurando com o Lucas no estúdio, mas, no violão, ela já foi feita assim. Eu queria criar um negócio com esse ritmo e falando de coisas do organismo brasileiro. Então, vieram nomes de mulheres. Comecei por aí e fui entrando em tudo que estivesse na minha cabeça a respeito dessa visão do Brasil miscigenado. De certa forma, é um pouco diferente da cultura de lutas identitárias definidas de grupos. É uma coisa mais ligada à tradição da exaltação de uma miscigenação, da mistura e da variedade vivida mais ou menos anarquicamente pela sociedade brasileira, com sua energia, do que uma submissão às cartilhas identitárias de hoje em dia. Isso pode até causar polêmica, não me incomodo, porque ela é mais assim. Porém, é assim com minha capacidade de ver. E tanto que chega até aquela menção a uma conversa que João Gilberto teve comigo, dentre as muitas que tivemos, na qual ele disse: "Caeta, somos chineses". Era engraçado. [Como a gente entende essa frase?] É dificílimo, é como grande poesia, é óbvio e é dificílimo entender ao mesmo tempo. Tem uma profecia, e ao mesmo tempo uma rebeldia de não se enquadrar no desenvolvimento ocidental estabelecido, ao qual a bossa nova chegou como algo que está na sua área mais elevada. O João chegou lá e é de lá que ele está falando. Então, havia uma rebeldia e também um esboço de profecia. Eu entendo mais com o coração do que com o pensamento. Mas ficou no meu coco, nunca saiu, e apareceu nessa canção. Veio esse negócio do João, e aí "meu coco", aí ficou o título da canção, que veio a ser o título do disco. Depois da base já pronta, cantando a voz guia e já tendo todas as percussões de Márcio Victor, convidei Thiago Amud pra escrever pra orquestra. "Rio Canaveses" é a Carmen Miranda. Carmen Miranda é de Portugal e veio pro Rio. A formação dela é de uma mulher carioca, mas nasceu em Marco de Canaveses. Isso é pra dar o arremate no negócio "com Naras, Bethânias e Elis/ Faremos mundo feliz". Porque é o projeto do Brasil contribuir com algo luminoso ao mundo. Salvar o mundo. Isso é uma das missões possíveis do Brasil e a minha escolhida. Quando eu falo 'Naras, Bethânias e Elis' é porque são cantoras cada uma muito diferente da outra, todas muito importantes na cabeca de quem quer que pense a música popular brasileira. Com esse trio, que abre todo um negócio, faremos um mundo feliz. É a missão do Brasil". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
"Comecei a escrever a música Meu Coco no verão de 2019, na Bahia. No começo era só uma batida rítmica, que eu fazia no violão, imaginando bateria pesada e percussão. Então os nomes de mulheres brasileiras conhecidas vieram até mim. Luana é uma modelo, hoje já uma velha senhora, cujo nome era Simone Raimunda, uma linda negra que veio do bairro Liberdade, em Salvador da Bahia. A partir daí continuei com outros nomes - e isso me levou a pensar no meu gosto por nomes (na década de 1970 gravei um disco chamado Cores, Nomes; agora um amigo me disse, brincando, que Meu Coco poderia ser chamado de Nomes, Nomes". (Caetano Veloso para El Observador, 2023).
"Comecei a sentir vontade de escrever Meu coco por causa da imaginação da batida rítmica. A letra e a melodia surgiram depois, aos poucos. Mencionei nomes de artistas brasileiras, como Maria Bethânia, Nara Leão e Elis Regina, e a lista foi crescendo. Um amigo me disse que esse disco deveria se chamar, parodiando um meu do século passado (Cores, nomes), “Nomes, nomes”. Bom, ao final havia um otimismo em relação ao Brasil que gerava desconfiança, até em mim mesmo, o que me lembra o que ouvi de outro músico brasileiro recentemente. O nome dele é Barão do Pandeiro. Ele disse que, ao contrário do que as pessoas dizem, o Brasil é um sucesso mesmo: chegou exatamente onde trabalhamos tanto para que chegasse: ao atraso. No entanto, escrevi a frase “Nação grande demais para que alguém engula” como uma declaração de princípios". (Caetano Veloso para o El País, 2023).
Foto: Fernando Young
2 - Ciclâmen do Líbano
Que as almas se chamem
E os corpos se amem:
Eis, poderosíssimos,
O que produzíamos
De signos divinos.
Teus cantos morenos
Onde os meus não menos
Perna, braço, artelhos,
Enfim, cada membro
Aninha-se - e espelhos
Dão-se entre os dois Vênus
De montes vermelhos
E vales amenos.
Que os anjos reclamem
E nos céus proclamem
Teu sol-mel dulcíssimo,
Flor em carne-espírito:
Ciclâmen do Líbano.
E os corpos se amem:
Eis, poderosíssimos,
O que produzíamos
De signos divinos.
Teus cantos morenos
Onde os meus não menos
Perna, braço, artelhos,
Enfim, cada membro
Aninha-se - e espelhos
Dão-se entre os dois Vênus
De montes vermelhos
E vales amenos.
Que os anjos reclamem
E nos céus proclamem
Teu sol-mel dulcíssimo,
Flor em carne-espírito:
Ciclâmen do Líbano.
Comentário do autor: "Pensei num amor vivido. Origem libanesa. Nome da cor que meu irmão Rodrigo destacava: Ciclâmen. Descoberta da flor de onde veio o nome desse tom de magenta. A flor como representação mental do segredo do corpo da mulher. Segredo revelado mas eternamente segredo. Senão não há mágica. Almas seguem chamando para que exista milagre de amor nos corpos. Quis voltar à minha levada que Djavan homenageou e Gil chamou de "Marcha Caetaneada". Num andamento mais lento, mais erótico, mais dengo-carinhoso. Pedi a Jaquinho que pensasse no oriente e ouvisse Webern. Conversa de maluco. Saiu beleza intensa na entrada da orquestra." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Repito a palavra Líbano em um ritmo lento, repetitivo. O conteúdo é explicitamente terno e sexual. Mas todo mundo pensa inevitavelmente nos momentos amargos que este país está passando. Já estive em Beirute e sei como esta terra e seu povo são lindos." (Caetano Veloso para a AFP, 2021).
"Nasceu da lembrança de um amor. E da palavra "ciclâmen" (assim pronunciada) repetida por meu irmão Rodrigo quando eu era menino. Era o nome de uma flor. Mais recentemente vi na internet imagens da flor, que dá principalmente em regiões do Líbano. A pessoa a quem a canção se refere tem ascendência libanesa. Para mim, resultou na faixa mais bonita de se ouvir no disco. Com a base que armei com Lucas Nunes e o som extraordinário das cordas de Jaques Morelenbaum." (Caetano Veloso para o portal GZH, 2022).
"É uma canção de amor. O ciclâmen é uma flor do Líbano, bonita, com uma cor magenta. E eu conhecia "ciclamen" como o nome de uma cor, depois fiquei sabendo da flor. Então, a canção é sobre uma mulher de origem libanesa com esse nome. Eu acho que tem uma conotação sexual, e quis fazer aquela "marcha caetaneada", mas mais lenta, pro ficar mais no âmbito do gostoso. Pedi a Jaquinho pra escrever um negócio de cordas, dei umas sugestões e terminou ficando mais bonito do que eu esperava. Ele faz uns fraseados que tem a coisa do Oriente Médio e tem algo de Webern, porque eu pedi a ele pra ouvir, e o resultado foi o que eu sonhava. Botei como segunda faixa do disco porque achei que ficou como a realização de uma total beleza." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Fernando Young
3 - Anjos Tronchos
Uns anjos tronchos do Vale do Silício
Desses que vivem no escuro em plena luz
Disseram: vai ser virtuoso no vício
Das telas dos azuis mais do que azuis.
Agora a minha história é um denso algoritmo
Que vende venda a vendedores reais,
Neurônios meus ganharam novo outro ritmo
E mais e mais e mais e mais e mais.
Primavera Árabe - e logo o horror.
Querer que o mundo acabe-se:
Sombras do amor.
Palhaços líderes brotaram macabros
No império e nos seus vastos quintais
Ao que revêm impérios já milenares
Munidos de controles totais.
Anjos já mi ou bi ou trilionários
Comandam só seus mi, bi, trilhões
E nós, quando não somos otários,
Ouvimos Shoenberg, Webern, Cage, canções…
Ah, morena bela
Estás aqui
Sem pele, tela a tela:
Estamos aí.
Um post vil poderá matar
Que é que pode ser salvação?
Que nuvem, se nem espaço há
Nem tempo, nem sim nem não. Sim: nem não.
Mas há poemas como jamais
Ou como algum poeta sonhou
Nos tempos em que havia tempos atrás
E eu vou, por que não? Eu vou, por que não? Eu vou.
Uns anjos tronchos do Vale do Silício
Tocaram fundo o minimíssimo grão
E enquanto nós nos perguntamos do início
Miss Eilish faz tudo do quarto com o irmão.
Comentário do autor: "Anjos Tronchos é uma canção que terminou ficando extremamente densa. Vivemos hoje mergulhados num mar de algoritmos, possibilidades diversas de redes sociais e aparatos tecnológicos que avançam muito depressa. Eu não tenho tanto domínio sobre o assunto, mas acredito que canções são capazes de obter reflexões na mente de quem as ouve." (Caetano Veloso para o site TechTudo, 2021).
"Não faltam razões para que a gente esteja amargo. Acho que essa canção tem um tom sombrio, mas não deixa de observar aspectos luminosos que vieram com essa revolução tecnológica. Aparecem ali poemas como jamais, pensando nos poetas concretos, principalmente Augusto de Campos, e coisas com desenvolvimento dos computadores. E no fim, no último verso, tem o caso da Billie Eilish. Ela já cresceu com a mente dentro desse mundo desenvolvido da tecnologia digital e tem um tipo de criatividade ligada a isso, que é luminosa e bela. Então há coisas também positivas. Mas a base da canção é sombria." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 2021).
"Embora eu não conheça muito a questão da tecnologia e das suas consequências, eu fiz uma canção que parece mexer em questões muito maiores do que seu autor é capaz de dominar. Tem muitas canções que tiveram resultados políticos, na formação da cabeça de gerações, de áreas da sociedade, e que não foram feitas por uma pessoa que conhecesse teoricamente a complexidade daquele assunto. Eu terminei pensando: “Deu para fazer uma canção que pode ser como uma dessas”". (Caetano Veloso em post nas redes sociais, 2021).
“Eu cheguei à palavra algorítimo porque fala-se muito nisso, quando se refere a realidade digital, ao mundo da computação. Mas eu não entendo nem muito de matemática nem o conceito, nem muito da cultura que se desenvolveu a partir do computador e da internet e, evidentemente, tenho contato com isso. Quando comecei a canção pensei que nem fosse completar, porque não sabia o suficiente sobre o assunto, mas os versos foram aparecendo para que pudesse se tornar uma canção. Eu gosto muito de Billie Eilish, mas jamais pensei em fazer uma parceria com ela. Não imagino que pudesse haver interesse do outro lado. Ela apareceu no final da canção como exemplo de uma coisa boa que vem dessa evolução tecnológica que nos deu computadores pessoais e a internet. Como a canção fala de muitas coisas horrendas que a gente deve a isso, é bonito falar de coisas boas. Primeiro falei do sonho de um poeta de fazer poesia visual mais complexa, eu me referia a Augusto de Campos, principalmente, e com esse desenvolvimento foi possível, e, no final, me veio Billie Eilish. Terminou como uma frase enigmática, mas muito simples. Fiquei sabendo que ela já havia usado esse nome das redes sociais ‘Miss Eilish’, e termina de uma forma muito simples, num informalismo informal (risos), Ela fez aquelas coisas, se tornou importantíssima e famosa com essa coisa neo-neo-cool fazendo tudo do quarto dela com o irmão." (Caetano Veloso para o portal Popline, 2021).
“O que eu penso sobre tecnologia é uma coisa que varia muito. Às vezes eu me irrito, às vezes eu me encanto, às vezes eu acho enigmático e às vezes simplesmente eu acho vital. Anjos Tronchos é uma canção sobre redes sociais, internet, computadores, em suma, tudo que foi inventado e continua sendo desenvolvido pelos anjos tronchos que se movem no Vale do Silício.” (Caetano Veloso em post nas redes sociais, 2021).
"Não tenho intimidade com computadores nem hábitos informático-digitais. Gosto do que resta de democrático na Wikipedia, mas volto aos livros. Pensei nos poucos mi, bi, trilionários que comandam as redes e usam os algoritmos. Mas não achei que completaria uma canção. Achei curioso que viessem novas ideias-versos e eu chegasse a completar o que pôde ser considerado uma canção. Pensei em Gil e em seus Cérebro Eletrônico, Pela internet e Quanta, de letras reflexivas. Tal como ele, não estudei antes para compor a canção falando do que aprendi. Fiz a partir do que não sei e fui esperando, como ele, que isso me levasse a estudar. Ainda espero." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Gil tinha mais interesse por esse tema do que eu. Ele escreveu muitas coisas sobre esses negócios desde aquele período [do tropicalismo] e ao longo dos anos. E eu, não. Fiquei mais interessado agora. Foi meio surpreendente pra mim o negócio dos ‘anjos tronchos no Vale do Silício’. Não uso muito internet, não tenho smartphone, não vejo rede social, não estudo o assunto." (Caetano Veloso para a Folha de S.Paulo, 2021).
"Essa imagem dos anjos tronchos do Vale do Silício ficava voltando à minha cabeça. Eu não acompanho redes sociais, não entendo muito dos assuntos ligados à internet. Assim, pensava que a canção que se insinuava em minha cuca era impossível de ser feita. Mas pequenos novos pensamentos, pequenas novas frases, na verdade versos, iam se somando aos iniciais. Depois de umas duas semanas vi que, entre as músicas que já estava gravando, essa crescia como eu nunca esperaria. Ganhou letra longa e não necessariamente irrelevante. Com o disco pronto, ela terminou virando o primeiro single a ser lançado. Chamei Pedro Sá pra tocá-la porque achei que a secura dos enunciados pediam som de banda Cê. É distópica, mas há clarões como o amor feito tela a tela e a menção aos poemas de Augusto de Campos." (Caetano Veloso para o portal GZH, 2022).
"Me veio à cabeça por causa desse tema dos computadores, laptop, internet, smartphones, redes sociais, esse mundo. Veio uma frase: "Os anjos tronchos do Vale do Silício". Pensei: "Silício dá uma rima boa, poderia fazer uma música". Mas eu não tenho smartphone, não entro em rede social. Aí lembrei do poema de Drummond, "um anjo torto desses que vivem na sombra". "O Poema de Sete Faces", que começa assim e eu já citei até em outra música. Outras frases foram vindo, e aí eu fiz aquilo com melodia e já comecei até a pensar em Pedro Sá pra tocar. Só que eu pensava: "Não tenho conteúdo dentro da minha cabeça sobre esse assunto pra concluir uma canção". Terminei fazendo estrofes demais, que nem se repetem na música. Não há refrão, não há repetição de estrofe. As ideias vinham vindo. E me lembrei de Gil, que fez muitas canções sobre esses assuntos sem conhecer teoricamente. Mas as canções são com letras reflexivas. Meu negócio não parece com o dele, mas a situação parece. (...) Há no disco muitos traços politicos que eu não tinha muita consciência anterior, mas que eu vi na feitura das canções, e nessa sem dúvida há. Tem um verso que fala: "Palhaços líderes brotaram macabros". É um verso só, mas está adensado aí todo um pensamento, talvez até muito comum. Mas adensado em um verso nessa sonoridade, ganha uma força que irradia pro resto da canção toda. Depois, isso se desdobra, quando abre um tom mais lírico e lamentoso sobre a Primavera Árabe. Porque a Primavera Árabe se deveu em grande parte às redes sociais. No entanto, muito daquilo resultou em um horror. Desde o que houve no Egito até o que aconteceu com a Síria. Esse lamento sobre a Primavera Árabe se soma, ou expande, o que já está muito condensado no "palhaços líderes brotaram macabros". Ou seja, são resultados abomináveis, aterradores, desse desenvolvimento tecnológico." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Capa do single de Anjos Tronchos por Rodrigo Araújo em foto de Fernando Young.
4 - Não Vou Deixar
Não vou deixar, não vou, não vou deixar você esculachar
Com a nossa história
É muito amor, é muita luta, é muito gozo, é muita dor
E muita glória
Não vou deixar, não vou deixar, não vou deixar porque eu sei cantar
E sei de alguns que sabem mais
(Muito mais!).
Não vou deixar, não vou deixar, não vou deixar, não vou deixar que se desminta
A nossa gana, a nossa fama de bacana, o nosso drama,
A nossa pinta
Não vou deixar, não vou deixar, não vou deixar porque eu sei cantar
E sei de alguns que sabem mais
(Muito mais!).
Apesar de você dizer que acabou
Que o sonho não tem mais cor
Eu grito e repito eu não vou!
(O menino me ouviu e já comentou:
"O vovô tá nervoso", o vovô...)
Nervoso, teimoso, manhoso
É muito amor, é muita luta, é muito gozo, é muita dor
E muita lida
Não vou deixar, não vou, não vou deixar você esculachar
Com a nossa vida.
Não vou deixar, não vou deixar, não vou deixar
Porque eu sei cantar
E sei de alguns que sabem mais
(Muito mais!).
Comentário do autor: "Uma recusa de submissão à opressão. Gostei quando "apesar de você" apareceu na letra. Quase escondida, essa frase me leva ao samba de Chico e sugere a dimensão política da canção. Fui gostando. Ficou sendo a minha preferida. Vai ouvindo devagar e deixa que o lance te arrebate." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Foi o que eu disse diante da televisão quando Bolsonaro foi eleito" (Caetano Veloso para a AFP, 2021).
"O presidente que nós temos é o pior que poderíamos imaginar. Mas ele é parte da cãimbra que nosso corpo histórico-social sofre. Não vou deixar é o que diz a voz de pessoas como Fernanda Montenegro." (Caetano Veloso para o UOL, 2021).
"Nós estávamos vendo a contagem dos votos, e vendo que Bolsonaro estava ganhando, e muitas pessoas ficaram angustiadas. E eu disse: "Mas ele não vai fazer o que ele quer fazer com o Brasil porque eu não vou deixar!". Falei com muita veemência na hora, e aí botei na letra da música. Não Vou Deixar é como se fosse uma música de amor, mas na verdade tem uma motivação política. Por isso aparece a frase, quase escondida, "apesar de você", por causa do samba de Chico. Sinceramente? É a música que eu mais gosto no disco. [Por quê?] Porque adoro aquele riff de piano que o Lucas fez. E foi curioso, porque não é das coisas que ele mais gosta, mas ele terminou fazendo a meu pedido e fazendo melhor do que eu esperava. Depois, a gente pediu a Jaquinho [Jaques Morelenbaum] pra fazer um solo de cello, que ficou lindo. Tem algo de nordestino, mas também uma entrega na volta do canto. E, depois, entra um funk estilizado com o violãozinho, e eu faço: "Não vo-ou deei-xar!". Adoro essa faixa". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Aline Fonseca
5 - Autoacalanto
O autoacalanto de Benjamim
Que, por enquanto, é o caçula de mim
É um deslumbramento
Ele emula o canto de um querubim-curumim
O que é mesmo que isso me ensina,
Um ser que si mesmo se nina?
Um quase lamento já é nota de tom
E tem cor de jasmim.
Eu nunca tinha visto nada assim.
Comentário do autor: "Ninei três filhos. Sempre cantando. O filho do meu mais novo (o único que não gostava de que eu cantasse para niná-lo) gemia em notas, repetindo padrões quase-melódicos, para fazer-se adormecer. Uma tarde, maratonei com ele no carrinho de bebê e ele cantou até adormecer. Maravilhado, fiz essa canção. Quando digo, no final da canção, que "eu nunca tinha visto nada assim", é a pura verdade." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Fiz essa canção para o Benjamim porque ele canta pra se ninar. Vi agora, lá em Portugal (durante turnê na Europa) que o filhinho da Carminho (cantora) também faz isso. As amigas da Jasmine, mulher de Tom (pai de Benjamim), dizem que acontece isso com os filhos delas também. Nunca tinha visto. Acho que é um fenômeno geracional. Os meninos que estão nascendo agora sabem cantar para si mesmos na hora de dormir. Fiquei aqui, próximo do pessoal da família, Tom ficou muito em casa porque Benjamim nasceu. Essas coisas me animam, mexem com o meu afeto. Eu adoro meus filhos, e um dele teve um filho, que fica perto de mim. Moreno tem dois filhos, mas Rosa já tem 15 anos, e José, 12. Então, é diferente, é um neném muito perto, em casa, a gente vendo crescer... Tudo isso estimula, me estimulou a fazer canções, a continuar fazendo o disco. Porque dá gosto de vida, dá felicidade, aí sou mais capaz". (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 2021).
"É, ao meu netinho mais novo, o Benjamim, filho de Tom, que cantava muito. Agora acho que já não canta, já está muito grande pra fazer isso, não sei. Ele dava um gemidinho repetitivo, e já meio melódico, pra se fazer dormir. E eu fiquei muito impressionado. Porque já criei três filhos, eu ninava todos eles e cantava, mas nenhum deles cantava. Nunca vi isso. E o Benjamim fazia até dormir. Aí fiz uma música sobre isso, Autoacalanto." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Fernando Young
6 - Enzo Gabriel
Enzo Gabriel,
Qual será teu papel
Na salvação do mundo?
Olha para o céu
Não faças só como eu
E o meu coração vagabundo.
Um menino guenzo
Ou um gigante negro de olho azul
Ianomâmi, luso, banto: Sul.
Eu, teu pai, te benzo e espero
Ver teu gesto pontual
Viramundo desde a cuia austral.
Enzo Gabriel
Sei que a luz é sutil
Mas já verás o que é nasceres no Brasil.
Comentário do autor: "Em 2018 e 2019, o nome mais escolhido por pais em todo o país foi o composto Enzo Gabriel. Li matéria sobre isso nos jornais e fiquei obcecado. Quis cantar o novo nome e pensar nos milhões de brasileiros que foram registrados assim." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Foram batizados muitos milhares de brasileiros com esse nome ‘Enzo Gabriel’. Então eu pergunto qual será o seu papel na salvação do mundo? A gente está passando por um período difícil, que nega muito tudo o que pode ser bonito numa canção ou na vida. E, quando a pergunta vem, é feita por um eu lírico que ainda está ligado à ideia de missão salvacionista do Brasil." (Caetano Veloso para a Folha de S.Paulo, 2021).
"Gabriel sempre foi um nome comum e popular no Brasil. Enzo é um nome italiano, começou a ser conhecido depois que uma estrela da televisão deu o nome Enzo a seu filho, há uns 20 anos. A combinação de Enzo com Gabriel é nova. E fiquei surpreso como este nome composto foi o mais popular em 2018 e 2019 no Brasil." (Caetano Veloso para a AFP, 2021).
"Essa pergunta, com um compromisso salvacionista, é feita num tom de melancolia que só não é irônica por causa do tom grave e enfático da sanfona de Mestrinho no solo. É uma pergunta mesmo. O que fará daqui a 18 anos um bando de meninos que receberam esse nome agora? O que fará um ou o que farão uns dentre eles?" (Caetano Veloso para o UOL, 2021).
"Eu vi nos jornais que foi o nome mais escolhido, aí fiz uma canção me dirigindo a qualquer um deles ou a todos. Falo que a figura pode ser Yanomami, luso, banto, um negro de olho azul, guenzo. Eu gosto que tem "guenzo", uma expressão que se usa em Pernambuco e na Bahia, que é o menino fraquinho. A pergunta a todos e a cada um deles é: qual será o seu papel na salvação do mundo? Gosto muito dessa canção, e entrou a sanfona do Mestrinho deslumbrantemente. Quando entra no meio solando, pra mim, arrebata o coração." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
"Quando a música Meu Coco ficou pronta, li em um jornal que o nome mais escolhido para os recém-nascidos brasileiros naquele ano havia sido Enzo Gabriel. Assim, um nome composto, colocado em milhares de crianças em todo o país. Isso mexeu comigo. Eu queria fazer uma música com esse tema. E deixei essa pergunta para aquela geração que estava vindo. O Brasil foi chamado de "País do Futuro" por Stefan Zweig, que vivia no Rio de Janeiro fugindo do nazifascismo europeu. No Rio, Zweig se suicidou, junto com a mulher, em 1942, ano do meu nascimento. Na música está aquela pergunta entre esperançosa e angustiada sobre o futuro do Brasil". (Caetano Veloso para El Observador, 2023).
Foto: Aline Fonseca
7 - GilGal
Vem de Pixinguinha a Jorge Ben
Pousa em Djavans
Wilson Batista, Jorge Veiga,
Carlos Lyra e o imenso Milton Nascimen
Vem de Pixinguinha a Jorge Ben
Ele me ensinou
O sentido do som
E eu quis ensinar
O sem som do sentido
Vem de Pixinguinha a Jorge Ben
Pousa em Djavans
Nossas almas irmãs
Rasgaram manhãs
Mas sem
Chegar aos pés dos Tincoãs
Comentário do autor: "Vi a palavra "Gilgal" no romance "José e Seus Irmãos", de Thomas Mann. Já a usei em Este Amor, do Estrangeiro. Aqui ela volta no título. E tudo flutua sobre a percussão de Moreno. Uma linhagem de pretos gênios que inclui, de repente, Carlos Lyra que, como Ary, Chico e Noel, não é preto. Pensei em cantar não sozinho. Vozes agudas em uníssono sobre os tambores. Chamei Dora Morelenbaum. Ela cantou tão perfeito que mantive só nossas duas vozes. Começo só, mas uma estrofe depois ela entra. E não sai mais." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"GilGal é faixa nobre. O canto de Dora Morelembaum colado ao meu flutua sobre o que é básico: Moreno no candomblé. Seu rosto e suas mãos sábios conduzem o surgimento de Gal e Gil no cubo mágico do nosso mundo." (Caetano Veloso em post nas redes sociais sobre o visualizer da canção, 2021).
"Foi vindo, começou com os nomes de Meu Coco [sobre o disco ter tantas referências da música brasileira]. Nomes de mulheres, depois nomes de pessoas e, finalmente, nomes de compositores, que apareceram em outras canções também. Quando chegou na GilGal, aí veio uma linhagem mais de compositores e músicos negros, né? No entanto, o Carlinhos Lyra está no meio. Porque ele era o favorito de Gil quando nós nos conhecemos no mundo da bossa nova. Então, o nome dele veio espontaneamente no verso. [E termina com Tincoãs, um dos grandes grupos da música baiana, da tradição afro-brasileira] É, uma turma maravilhosa. Eu adoro, sempre adorei, e veio na minha cabeça. E "Djavans" vem no plural, né? "Pousa em Djavans". [Por quê?] Porque Djavan se multiplicou pelo Brasil. Você chega na praia de Copacabana e tem um pessoal tocando, num bar em Belém do Pará, em Natal, em Porto Alegre. Tem sempre alguém cantando ao vivo, de noite, reproduzindo o Djavan. Então, Djavans é uma pluralidade. "Nossas almas irmãs" é falando de eu e Gil e Gal. Porque GilGal é uma palavra bíblica, mas junta os dois nomes. É curioso que haja essa palavra. E "Ele me ensinou/ O sentido do som" é Gil, né? Aí vem de Pixinguinha a Djavans. E "Nossas almas irmãs/ Rasgaram manhãs", eu, Gil e Gal cantando, digamos abrindo vozes nos Doces Bárbaros, né? Mas sem chegar aos pés dos Tincoās." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Fernando Young
8 - Cobre
Vibre o bronze de Santana
Sol das onze sobre o teu
Quase cobre que descobre
Que é o meu amor
Que emana desse céu
Tua pele é o cobreado
Da Bahia de nós dois
Grei de escravizados e opressores
Reis do estado que virá depois
Ó mulher de tez nobre
Toma tudo e me tem
Sobre teu bronze-cobre quem não vem?
Temos tudo tando juntos
Tanto teremos no amém
Ó mulher de tez nobre, toma e bem
Ter te visto tão de perto
E talvez voltar a ver
Prova que está tudo certo
Vale ter vivido
Vale estar vivendo aqui
Vale viver.
Comentário do autor: "Cor de pele de baiana que concorre com os reflexos do sol no fim de tarde do Porto da Barra. Depois reli que Jorge Amado já escrevia "cobre" para caracterizar o tom de pele de muitos baianos. Nesta canção de amor, pareço estar mais eu mesmo por isso. Quando estava inventando a canção, pedi que "cobre" só não fosse interpretada como variação do verbo cobrar. Do metal ao cobrir, tudo certo e bom. Temia o sentido de cobrança. Maluco fazendo música." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"É sobre uma pele de menina que tem cor de cobre. E o Jaquinho Morelenbaum ficou louco pela música, porque ele é muito romântico. É a canção romântica do disco, mais do que Ciclâmen do Líbano. E aí ele fez um negócio com a melodia tocada pelas cordas, uns contrapontos emocionais. É a favorita dele, a que mais emocionou Jaquinho." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Fernando Young
9 - Pardo
Nêgo,
Seu rosa é mais rosa que o rosa da mais rosa rosa
Veio um beijo preto
Sangue sob a pétala
Veio um papo reto
Língua sobre a úvula
Nêgo,
Nenhum orixá poderá desmanchar o que houve lá
Pra que me quereres?
Homens e mulheres há
Por que tanto queres
Não me querer, querer?
Sou pardo e não tardo a sentir me crescer o pretume
Sou pardo e me ardo de amores por ti sem ciúme
Sou pardo e não tardo a sentir me crescer o pretume
Sou pardo e me ardo de amores por ti sem ciúme de amores,
Nêgo.
Seu rosa é mais rosa que o rosa da mais rosa rosa
Veio um beijo preto
Sangue sob a pétala
Veio um papo reto
Língua sobre a úvula
Nêgo,
Nenhum orixá poderá desmanchar o que houve lá
Pra que me quereres?
Homens e mulheres há
Por que tanto queres
Não me querer, querer?
Sou pardo e não tardo a sentir me crescer o pretume
Sou pardo e me ardo de amores por ti sem ciúme
Sou pardo e não tardo a sentir me crescer o pretume
Sou pardo e me ardo de amores por ti sem ciúme de amores,
Nêgo.
Comentário do autor: "Sou pardo. Hoje se usa muito esta palavra. Quando criança, ouvia minha mãe rir por terem posto em não sei que documento dela a caracterização: "Cor: Parda". Ela parecia uma indiana clara. Meu pai é que era mulato. Amor com um homem preto. Escrevi para Céu cantar. Mas achei bonita pra caramba." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"A Céu me pediu uma canção, e eu fiz essa pra ela cantar. Eu imaginei por causa da palavra "pardo", que vem sendo muito usada e que, na verdade, eu conhecia de casa. Porque eu sou pardo, né? Meu pai era mulato e minha mãe parecia uma indiana. E ela até foi registrada oficialmente, "cor parda", e ela ria disso um pouco. Hoje, se usa muito: "negros e pardos". Então, eu visualizei uma cena de amor de um pardo com um homem negro e fiz a letra. O Letieres é uma maravilha. Quando a gente concluiu a base toda - com Marcelo Costa fazendo a percussão, ele sozinho fazendo um Olodum inteiro -, depois de tudo pronto, aí a gente mandou pra Letieres. E Letieres, na Bahia, fez os arranjos com metais. Evidentemente ficou lindo, né?". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Aline Fonseca
10 - Você-você
Depois que nós nos perdemos
Amor, amor, nossos demos
Afastam-nos ano a ano
Você-você é teu nome
És quem ressurge e quem some
Do outro lado do oceano
Eu cá nesta Americáfrica
Vivo entre miséria a mágica
Não sei dizer o que valho
Tu que és você não em chamas
Tambor, tambor sob as camas
Langor rebaixa-me o galho.
"O orvalho vem caindo"
Não podes negar que é lindo
Requer de nós grande arte
Criar novo mundo louco
É muito e inda é muito pouco
Que aprendas a conjugar-te
Tu és você, sou você
Eu e tu, você e ela
Ary, Noel, Tom e Chico
Amália, blues, tango e rumba
Atabaque e bailarico
Peri, Ceci, Ganga Zumba.
Comentário do autor: "Nasceu do fato de Carminho tirar "você" das letras de canções brasileiras que cantou. Disse primeiro a ela. Suas respostas foram sinceras e pertinentes. "Você", em Portugal, não se usa como tratamento íntimo e amoroso. Impasse: por que então cantar canções brasileiras? Resposta: sentimento intenso mas não podendo sair sincero se digo "você". Ela não queria perder as canções nem cantá-las de modo a sentir-se distanciada. No fim das contas transatlânticas, retomamos o assunto quando fui a Lisboa e isso resultou numa participação dela no disco. Tudo ficou mais lindo quando Carminho cantou." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"A canção nasceu por causa dela [Carminho]. O eu romântico da canção - aquele que diz "eu" na canção, e como todo mundo sabe, essa pessoa não é necessariamente eu - está se dirigindo basicamente a Carminho por ela ter gravado canções brasileiras e evitado a palavra "você". O tratamento "você" não é usual em Portugal, não tem o mesmo peso que tem no Brasil. No Brasil, é o tratamento de mais espontânea e direta intimidade. Não é o caso de Portugal. Eu tive uma conversa com ela sobre isso, meio reclamando, meio perguntando, e ouvi dela respostas muito pertinentes e que justificavam em grande parte a decisão dela de evitar o "você" nas canções brasileiras e, ao mesmo tempo, enriqueceram a minha própria argumentação. Essa canção é um passo a mais no caminho dessa conversa entre eu e Carminho, que, pra mim, é essencial, porque é a conversa entre Brasil e Portugal. Ou seja, uma conversa dentro da história da língua portuguesa. E Paulinha [Lavigne] sugeriu que ela participasse da gravação da canção, que eu já tinha começado a gravar e que se dirige a ela. Curiosamente, depois que a canção já estava pronta e com o título Você-Você, me disseram que o Chico Buarque tem uma canção que chama Você, Você. [Queria que você explicasse e comentasse o trecho: "Tu és você, sou você/ Eu e tu, você e ela/ Ary, Noel, Tom e Chico/ Amália, blues, tango e rumba/ Atabaque e bailarico/ Peri, Ceci, Ganga Zumba"]. Explicar isso é quase impossível, porque é muito denso. No final, a letra fica mais radicalmente poética. "Tu és você" já é a base da nossa discussão, é um resumo da música e da história toda. Quase virou o título para não ficar parecido com o do Chico Buarque. Mas fiquei com pena de gastar essa frase que vem no meio da canção. E, no fundo, eu gostei de ter uma canção com título que é basicamente igual ao de uma canção do Chico. Então, "tu és você" já é uma síntese do negócio todo de "sou você", ou seja, quero que você me chame de "você". Ao mesmo tempo, somos a mesma pessoa porque ambos falamos português. "Eu e tu, você e ela", porque "ela" é a terceira pessoa. E, no fim das contas, depois de dizer "Noel, Ary, Tom e Chico", quatro grandes compositores brasileiros, vem Amália [Rodrigues, cantora portuguesa]. Esse "ela", de uma certa forma, já é Amália. E a Amália não aparece como uma pessoa, aparece como um gênero: "Amália, blues, tango e rumba". É como se Amália fosse o fado, entendeu? E o tema "AméricaÁfrica" volta no final. Depois de "Amália, blues, tango e rumba/ Atabaque e bailarico" - quer dizer, África e Portugal -, vem "Peri, Ceci" - Peri é índio, Ceci é filha de portugueses, é do romance O Guarani, que também virou a ópera brasileira mais conhecida no mundo -, e finalmente "Ganga Zumba", que foi o primeiro líder do maior quilombo na história da escravidão no Brasil. Aí termina a explicação dessa estrofe cheia de coisa". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
11 - Sem Samba Não Dá
Olho pro Cristo ali no Corcovado
E, em silêncio, grito "êpa Babá"
Tudo esquisito, tudo muito errado
Mas a gente chega lá
Tem muito atrito, treta, tem muamba
Mas tem sertanejo, trap, pagodão
Anavitória, doce beijo d'onça
Mar(av)ilia Mendonça, afinação
Vai chegando que a gente vai chegar
Về se rola, se tudo vai rolar
Só que sem samba não dá
(Tem sambanejo ou pagobrejo
Tem Ferrugem, Glória Groove, Maiara e Maraísa
Yoùn, Yoùn,
Tem Djonga com Rogério,
MC Cabelinho, tem Baco Exu do Blues
Tem gente pra xuxu
Tem Duda Beat, Gabriel do Borel, Hiran e Majur,
Tz da Coronel,
Tem Simone e Simaria sambando,
Tem Leo Santana e a Mendonça
(No Pelourinho com a Didá)
Sem samba não dá
Sem samba não dá.
Comentário do autor: "Pretinho da Serrinha perguntou se não ia ter um samba no disco. Aí fiz um pra ele. O título diz tudo: sem samba não dá. E Pretinho veio com sua turma fazer o melhor samba de estúdio que pode existir. Nomes de figuras da música de hoje no Brasil vêm surgindo debaixo do refrão. Tudo o que veio espontaneamente ao meu coco." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"Pretinho (da Serrinha) disse: 'Não vai ter samba no disco?'. Pensei 'Sem samba não dá'. E fiz. Quis fazer um com sanfona do Mestrinho para ficar meio sambanejo. A própria melodia, as mudanças harmônicas, têm a ver um pouco com algumas coisas de samba modificado que tenho visto no 'TVZ' (programas de clipes musicais do Multishow). E também muitas coisas que o Zeca me mostra. Ele é meu grande conselheiro. Antes de fazer o disco, tive muitas conversas com ele sobre o jeito em que sonhava fazer. E ele me mostrava muitos exemplos tanto de coisas estrangeiras como brasileiras, lembranças de coisas antigas e apresentação de coisas muito novas. Tem uma porção de gente que cito que conheci por causa de Zeca: MC Cabelinho, TZ da Coronel, Gabriel do Borel. E outras que conheci vendo 'TVZ'." (Caetano Veloso para o Jornal O Globo, 2021).
"Vejo muito TVZ no Multishow. Ouço funk e trap e sertanejos também com Zeca no smartphone dele. Ao escrever Sem samba não dá para Pretinho da Serrinha (ele tinha me perguntado se não haveria um samba no meu novo disco), deixei os nomes virem à cabeça sem pensar antes. Sou tropicalista. Em 1967 comecei a precisar detectar os sinais de vitalidade que viessem da cultura de massas e lutei contra o preconceito contra áreas de expressão que eram desqualificadas por julgadores sub-sofisticados. O que me chamou a atenção ao ouvir a lista que canto foi que, entre os sertanejos, preferi as mulheres. Não que eu não admire algumas duplas masculinas (e que Zeca não me mostre coisas fascinantes cantadas por homens), mas, deixando a cabeça solta, foram as mulheres que se impuseram. Mas o disco como um todo não celebra só o que aparece no TVZ: Thiago Amud e Chico Buarque são cruciais. Um é citado apenas na ficha técnica da canção que abre o disco; o outro, em algumas canções. Mas tem que se saber deles pra se entender a presença de Glória Groove ou Duda Beat. Bem, adoro que Simone e Simaria sejam baianas. Canção tem mesmo a ver com quantidade e intensidade." (Caetano Veloso para o UOL, 2021).
"Fiz o samba pra Pretinho da Serrinha, que tinha me perguntado se no novo disco não haveria um samba pra ele tocar. Mas fui direto para as proximidades do sambanejo e do pagode pós-moderno. Acordeon, tom alto, modulações harmônicas surprendentes sob melodia de intervalos repetidos, até cair num refrão bem tradicional, quase samba-de-roda, raiz. É um comentário geral sobre o que se vem fazendo com o samba hoje. Pretinho sacou logo." (Caetano Veloso para a IstoÉ, 2021).
"Pretinho da Serrinha falou assim: "E um samba? Não vai ter um samba pra gente tocar?". Aí eu fiz um samba e pedi que chamasse a turma dele, com quem ele gosta de tocar. Ele sabe que, pra mim, é o que há de melhor em gravação de samba no estúdio, Pretinho da Serrinha é um tesouro nacional. Aí chamei Mestrinho pra tocar acordeon, porque tem um pouco desse samba que a gente ouve hoje, que é meio samba e meio sertanejo. Sambanejo, né? Aí inventei a palavra "pagobrejo". Botei lá e ficou bacana. É muito diferente das outras faixas do disco, é a única que tem uma banda de samba tocando". (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Fotografia: Fernando Young
12 - Noite de Cristal
Noite, centelha de noite
Noite luzidia
Nua na telha de vidro
Nua mãe Maria
Noite multiplica o brilho
Voz de agudo som
Chuva de arroz, trigo e milho
Noite de Ano Bom
Noite-prisma
Momento total
O mundo cisma
Mas eu miro teu cristal
E vejo e peço dias
De outras cores,
Alegrias
Para mim
Pra o meu amor
E meus amores.
Comentário do autor: "Bethânia, minha genial irmã, tinha me pedido uma música pra seu disco faz tantos anos. Agora, ela mesma me relembrou essa canção quase esquecida e fiquei encantado com a beleza. Canções assim nem me lembro que são minhas. Adoro que termine com a expressão "meus amores". Adoro esse plural. E a música toda é bonita. Márcio Victor juntou uma turma na Bahia e pôs a percussão com que eu sonhava. O disco fecha com minha voz cantando "E do Carlinhos Brown", que foi quem primeiro gravou essa música com Bethânia e quem pôs "a banda do Olodum" entre as estrofes." (Caetano Veloso para o storyline do Spotify, 2021).
"[É sobre] o telhado de nossa casa em Santo Amaro, na Bahia. Conseguíamos ver parte da lua, ou sua luz, de nossas camas". (Caetano Veloso para a AFP, 2021).
“Escrevi Noite de Cristal no final dos anos 1980 pra Maria Bethânia gravar. Fiquei desenhando o rosto dela cercado de cores enquanto ouvia a música que encerra o álbum Meu Coco. Carlinhos Brown gravou com ela nos 80. Foi ele quem pôs "a banda do Olodum" na jogada. Então, agora que sou eu a cantar, faço o retrato de Bethânia e canto o nome de Brown.” (Caetano Veloso sobre o visualizer da faixa, 2021).
"Bethânia me pediu pra gravar e disse: "Você devia gravar aquela música Noite Luzidia". Ela própria lembrou de um dos versos, mas não do título. O título é Noite de Cristal, Noite Luzidia teria sido melhor. Mas é que, na verdade, essa música é de uma lembrança minha, e que também é de Bethânia. Na casa onde a gente cresceu em Santo Amaro, a maioria dos quartos, onde eu dormia, por exemplo, não tinha forro, era direto nas telhas. E sempre, em cada cômodo, tinha uma telha de vidro, pra que entrasse o sol durante o dia. Então, você podia ver a lua às vezes, ou somente a luz da lua. É sobre isso, sobre aquela experiência de estar na cama de noite e ter a lua nua na telha de vidro. Ela lembrou da música e pediu pra eu relembrá-la, porque a música não chegou a ficar conhecida, que eu saiba. E quando eu fui ouvi-la, porque eu não lembrava, achei bonita pra caramba." (Caetano Veloso para a Revista Noize, 2023).
Foto: Instagram Marcelo Costa.
Foto: Instagram Mestrinho.
Com Márcio Victor no estúdio.
Com Vinícius Cantuária.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Instagram Caetano Veloso.
Foto: Aline Fonseca
Foto: Aline Fonseca
Foto: Aline Fonseca
Ficha Técnica
Uma realização Uns Produções
Direção Artística: Caetano Veloso
Produção Musical: Caetano Veloso e Lucas Nunes
Diretora de Produção: Paula Lavigne
Produção Executiva: Brisa Torres
Produção Executiva em Portugal: João Franklin
Comunicação: Danilo Rodrigues
Assessoria Jurídica: Caio Mariano Advogados
MEU COCO
Caetano Veloso: Voz
Moreno Veloso, Zeca Veloso e Tom Veloso: Coro
Lucas Nunes: Violão, Baixo, Guitarra e Pocket Piano
Márcio Victor: Timbal, Talk Drums, Timbales, Atabaque, Derbak, Shake, Balde, Tamborim, Aro, Alfaia, Surdo Virado e Surdo
Thiago Amud: Arranjos de Sopro
Alef Caetano: Flautim e Flauta em Dó
Alexandre Andrés: Flauta em Dó e Flauta Baixo
Marcela Nunes: Flauta em Sol e Flauta em Dó
Jonas Vitor: Sax Alto e Tenor
Tiago Ramos: Sax Alto e Barítono
Juventino Dias: Trompetes
Alaécio Martins: Trombone
Fabio Ogata: Trompas
Técnicos de Gravação: Lucas Nunes, Caetano Veloso e Pedro Durães (Gravação de Sopros)
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e New Doors (BH)
CICLÂMEN DO LÍBANO
Caetano Veloso: Voz e Violão
Lucas Nunes: Baixo
Márcio Victor: Caixa, Prato, Bongô, Atabaque, Derbak, Hindu, Pandeiro Árabe e Surdo
Jaques Morelenbaum: Arranjo de Cordas e Regência
Daniel Guedes (Spalla), Pedro Mibielli, Suray Soren, Fernando Matta, Thiago Teixeira e Tamara Barquette: 1° Violino
Antonella Pareschi, Léo Ortiz, Rogério Rosa, Carol Panesi, William Doyle e Leonardo Fantini: 2° Violino
Diego Silva, Pedro Amaral, Bernardo Fantini e Carlos Santos: Viola
lura Ranevsky, Claudia Grosso, Hudson Lima e Daniel Silva: Violoncelo
lura Ranevsky: Arregimentação Cordas
Roadie Percussão: Marcos Lima
Técnicos de Gravação: Lucas Nunes, William Luna (Gravação de Cordas) e Paulada.
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ), Cia dos Técnicos (RJ) e Groove (SSA)
ANJOS TRONCHOS
Caetano Veloso: Voz
Pedro Sá: Guitarra e Baixo
Lucas Nunes: Sintetizador
Pretinho Da Serrinha: Zabumba e Triângulo
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado no Estúdio Lavigne (RJ)
NÃO VOU DEIXAR
Caetano Veloso: Voz
Lucas Nunes: Piano, Programação, Sintetizador, Coro "muito mais" e violão
Zé lbarra: Violão
Vinícius Cantuária: Surdo, Bumbo, Caixa, Pandeiro, Tamborim, Repique e Atabaque
Jaques Morelenbaum: Violoncelo
Felipe Larrosa Moura: Caixa com prato
Técnicos De Gravação: Lucas Nunes e Igor Ferreira
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ)
AUTOACALANTO
Caetano Veloso: Voz e Violão
Tom Veloso: Violão
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado no Estúdio Lavigne (RJ)
ENZO GABRIEL
Caetano Veloso: Voz
Lucas Nunes: Violão, Guitarra e Baixo
Mestrinho: Acordeão
Pretinho Da Serrinha: Agogô
Vinícius Cantuária: Bateria, Caxixi, Surdo e Guizo
Técnicos De Gravação: Lucas Nunes e Caetano Veloso
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e M Estúdios (Atibaia/SP)
Roadie Percussão: Marcos Lima
Técnicos de Gravação: Lucas Nunes, William Luna (Gravação de Cordas) e Paulada.
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ), Cia dos Técnicos (RJ) e Groove (SSA)
ANJOS TRONCHOS
Caetano Veloso: Voz
Pedro Sá: Guitarra e Baixo
Lucas Nunes: Sintetizador
Pretinho Da Serrinha: Zabumba e Triângulo
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado no Estúdio Lavigne (RJ)
NÃO VOU DEIXAR
Caetano Veloso: Voz
Lucas Nunes: Piano, Programação, Sintetizador, Coro "muito mais" e violão
Zé lbarra: Violão
Vinícius Cantuária: Surdo, Bumbo, Caixa, Pandeiro, Tamborim, Repique e Atabaque
Jaques Morelenbaum: Violoncelo
Felipe Larrosa Moura: Caixa com prato
Técnicos De Gravação: Lucas Nunes e Igor Ferreira
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ)
AUTOACALANTO
Caetano Veloso: Voz e Violão
Tom Veloso: Violão
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado no Estúdio Lavigne (RJ)
ENZO GABRIEL
Caetano Veloso: Voz
Lucas Nunes: Violão, Guitarra e Baixo
Mestrinho: Acordeão
Pretinho Da Serrinha: Agogô
Vinícius Cantuária: Bateria, Caxixi, Surdo e Guizo
Técnicos De Gravação: Lucas Nunes e Caetano Veloso
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e M Estúdios (Atibaia/SP)
GILGAL
Caetano Veloso: Voz
Dora Morelenbaum: voz
Moreno Veloso: Sino, Surdo, Agogô, Rum, Rumpi e Lé
Caetano Veloso, Moreno Veloso e Lucas Nunes: Palmas
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e Casinha (RJ)
COBRE
Caetano Veloso: Voz e Violão
Jorge Helder: Baixo
Marcelo Costa: Bateria e Caxixi
Jaques Morelenbaum: Arranjo e Regência
Daniel Guedes (Spalla), Pedro Mibielli, Suray Soren, Fernando Matta, Thiago Teixeira e Tamara Barquette: 1° Violino
Antonella Pareschi, Léo Ortiz, Rogério Rosa, Carol Panesi, William Doyle e Leonardo Fantini: 2° Violino
Diego Silva, Pedro Amaral, Bernardo Fantini e Carlos Santos: Viola
lura Ranevsky, Claudia Grosso, Hudson Lima e Daniel Silva: Violoncelo
Iura Ranevsky: Arregimentação Cordas
Andrea Ernest Dias, PC Castilho e Edu Neves: Flauta em Sol
Carlos Malta: Flauta Baixo
Técnico De Gravação: Lucas Nunes e William Luna (Gravações de Cordas)
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e Cia dos Técnicos (RJ)
PARDO
Caetano Veloso: Voz e Violão
Miguel Góes: Baixo
Marcelo Costa: Vassoura; Prato e Faca, Repique, Caixa, Timbal e Surdo
Letieres Leite: Arranjo de Sopros, Regência e Flauta em Sol
Ivan Sacerdote: Clarinete
André Becker: Flauta Transversal
Josely Saldanha: Trompa
Jean Marques: Fagote
Rowney Scott: Saxofone Soprano
Gilmar Chaves: Trombone
Joatan Nascimento: Flugelhorn
Emílio Souza Santos: Arregimentação Sopro
Técnicos de Gravação: Lucas Nunes e Tadeu Mascarenhas (Gravação de Sopros)
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e Estúdio Casa das Máquinas (SSA)
VOCÊ-VOCÊ
Caetano Veloso: Voz
Carminho: Voz
Caetano Veloso: Violão
Moreno Veloso: Sino, Surdo, Agogô, Rum, Rumpi e Lé
Caetano Veloso, Moreno Veloso e Lucas Nunes: Palmas
Participação Especial: Hamilton de Holanda (bandolim)
Técnico de Gravação: Lucas Nunes
Técnico de Estúdio (Portugal): André Tavares
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e Atlântico Blue Studios (Poços dos Arcos/Portugal)
SEM SAMBA NÃO DÁ
Caetano Veloso: Voz
Xande de Pilares, Pretinho da Serrinha, Moreno Veloso, Tom Veloso, Dora Morelenbaum, Zé lbarra e Lucas Nunes: Coro
Rafael dos Anjos: Violão
Charles do Bonfim: Baixo
Xande de Pilares: Banjo
Mestrinho: Acordeão
Pretinho da Serrinha: Cavaco, Tantan, Surdo, Pandeiro, Repique de Anel, Ganzá, Caixa, Repinique, Tamborim, Reco-Reco, Agogô, Cuica e Apito
Técnicos de gravação: Lucas Nunes e lgor Ferreira
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado no Estúdio Lavigne (RJ)
NOITE DE CRISTAL
Caetano Veloso: Voz e Violão
Miguel Góes: Baixo
Lucas Nunes: Guitarra
Márcio Victor: Surdo, Caixa e Repique
Jorginho Barbosa: Repiques, Caixa e Surdo de Meio
Jadsom Souza: Repiques, Caixa e Surdo de Meio
Jaques Morelenbaum: Arranjo de Cordas, Regência e Violoncelo Solo Daniel Guedes (Spalla), Pedro Mibielli, Suray Soren, Fernando Matta, Thiago Teixeira e Tamara Barquette: 1° Violino
Antonella Pareschi, Léo Ortiz, Rogério Rosa, Carol Panesi, William Doyle e Leonardo Fantini: 2° Violino
Diego Silva, Pedro Amaral, Bernardo Fantini e Carlos Santos: Viola
lura Ranevsky, Claudia Grosso, Hudson Lima e Daniel Silva: Violoncelo
lura Ranevsky: Arregimentação Cordas
Roadie Percussão: Marcos Lima
Técnicos de gravação: Lucas Nunes, William Luna (Gravações de cordas) e Paulada (Gravação de Percussão)
Mixagem: Daniel Carvalho e Lucas Nunes
Masterização: Alexandre Rabaço
Gravado nos Estúdios Lavigne (RJ) e Cia dos Técnicos (RJ)
O LP "Meu Coco" lançado pela Noize Record Club
Fotos: @muhsikend.