Caetano responde a Carlos Sandroni: ainda o Feitiço (28/06/2008)

 

Caetano mandou esta resposta de Moscou:

“Adorei ver que o Sandroni pensou mais sobre o assunto. Foi para isso que levantei a questão em Santo Amaro. Claro que “Feitiço” não se propõe como superação de “Feitiço da Vila” assim como “Dom de iludir” não pode ser tomada como superação de “Pra que mentir”. Em nenhum nível. De cara, “Feitiço da Vila” não deixa de ser uma obra-prima por conter trecho ostensivamente contra a cultura afro-brasileira. Nunca imaginei Noel Rosa como sendo racista. E nem resquícios vejo nele de homofobia. Quando caracterizei Wilson como preto, macumbeiro e veado, fiz caricatura dos preconceitos da classe média - e tinha na cabeça as histórias sobre Ismael Silva e o samba gay de Noel (que planejo cantar na seqüência do “Obra em Progresso”), de que tomei conhecimento no livro de Didier e Máximo. O livro deles é muito bom e rico mas às vezes me parece um pouco idealizador da figura de Noel. O livro e o estilo de Sandroni me convencem sempre mais.

É um prazer ler esse texto que ele nos mandou agora. Mas o erro dele foi tomar essa grande cena de sub-intelectual de miolo mole que fiz numa das noites do projeto “Obra em Progresso” como sendo expressão de miolo duro. Como ele mesmo notou, nem sequer apurei o status dos versos que ali apareceram como sendo os finais. Sei que não estão na gravação de Aracy dos anos 50. Suponho tê-los ouvido num disco tardio de Sílvio Caldas. Lembrava do cadeado e do ladrão mas nada do chorar pra mamar em ritmo de samba. Esses dois versos que precedem o do cadeado me foram apresentados por Jorge Mautner e eu os somei aos dois “últimos” para ter uma estrofe inteira e dar graça ao comentário que, sem ter planejado previamente, decidi incluir a respeito da parte problemática da letra.

O feitiço sem farofa, sem vela e sem vintém, que nos faz bem é que é a parte dura, com a indicação de que o outro, que seguramente nos faz mal, não é decente. Não há nada de comparável a isso na “Lenda do Abaeté” de Caymmi. Nesta, o medo do sobrenatural é apresentado como prova de que a lagoa é sagrada. Diz-se que um pai até castiga o filho se ele se aproximar dela porque se tem orgulho da carga sacra que ela contém. É, como tudo em Caymmi, algo próximo da mera propaganda turísitca da Cidade do Salvador.

Nunca li o livro de Yvonne Maggie. Apenas assinei com ela o documento contra a instituição de cotas raciais que enviamos ao Supremo Tribunal. Mas sei que “feitiço” não é uma palavra em geral tomada como positiva. Por causa de ter assinado com Yvonne aquela carta, recebi cartas magoadas - às vezes iradas. No mesmo show em que comentei “Feitiço da Vila” respondi, com carinho, a uma delas. Abri o show cantando o mantra do “mulato nato” de “Sugar Cane Fields Forever”, do Araçá Azul, e argumentei docemente contra a recusa do termo “mulato” por parte do cineasta Joel Zito, que foi um dos que me escrveram. O comentário ao samba de Noel veio, em parte, como complemento dessa discussão. Era, num show, fazer um largo número sugestivo em que justapunha Noel e Joel.

E a exposição dessa imensa pulga que está atrás da minha orelha desde pelo menos 1965 (quando escrevi artigo contra o livro de Tinhorão, que era adorado por parte da esquerda da época) foi, como a própria assinatura do manifesto contra as cotas, um modo de complexificar a discussão. E sua parte mais agressiva não vai contra Noel mas contra a tradição crítica iniciada por Tinhorão e que, se foi às vezes hostilizada e mesmo ridicularizada, nunca foi suficientemente enfrentada em alguns dos pontos mais graves - e a avaliação de Noel como classe-média com a autorização para fazer samba que é negada a Carlos Lyra é um desses.

O problema não é se Noel era racista mas se Tom Jobim é um usurpador. Pois Noel, autor desse verdadeiro manifesto da entrada da classe média no samba (o bacharel, o feitiço decente, que nos faz bem) é sempre apresentado como “o amigo de Cartola”. Sem dúvida “Palpite infeliz” (samba talvez ainda mais belo do que “Feitiço da Vila”) traz a palavra final: “Estácio, Salgueiro e Mangueira… sempre souberam muito bem que a Vila não quer abafar ninguém, só quer mostrar que faz samba também”. Mas os versos que contêm tal argumentação são prova de que não passou em tão brancas nuvens a agressão contida em “Feitiço da Vila”. Sobretudo na cabeça do próprio Noel.

Zabé come Zumbi, Zumbi come Zabé. Essa é minha fórmula definitiva. Amo a Princesa Isabel. Joaquim Nabuco conta, em “Minha Formação”, que André Rebouças lhe escreveu dizendo: “a República foi proclamada CONTRA o 13 de Maio”. Conheço a informação de que Isabel planejava indenizar os ex-escravos. Ressaltei que Noel frisou a origem do nome do bairro porque ouço ecos da frase: “a culpa é da Princesa Isabel”, um refrão racista à brasileira, isto é, bem relaxado e com toque de humor, usado com freqüência na minha infância quando alguém queria se queixar de algum prejuízo que lhe tinha sido causado por alguém que fosse negro. A Princesa Isabel, no meu ambiente de festejos anuais do 13 de Maio, foi sempre, no meu coração, a figura mais amável da história brasileira.”

| Assuntos: Carlos Sandroni, Feitiço da Vila —

14 Comentários sobre o Post “Caetano responde a Carlos Sandroni: ainda o Feitiço”

  1. Bruno Guimarães disse:
    Junho 28th, 2008 at 9:24 pm

    O altíssimo nível do debate que se lê nessas páginas somado ao fato de Caetano ser o primeiro dos músicos que compõem o Olimpo da MPB a se dispor a se expor de forma tão clara e a permitir esse contato quase direto com seus fãs me enche de alegria.

  2. Igor Lucas Adorno Santos disse:
    Junho 29th, 2008 at 2:04 am

    Concordo com o Sandroni no q diz respeito à achar exagerada a acusação de racismo em “Feitiço da Vila”, pertinente, apenas, se considerarmos tal canção em separado do restante da obra do Noel Rosa.
    Acredito q uma visão um tanto supersticiosa do Noel
    (coisa bastante corriqueira nos brasileiros de hoje, inclusive em ateus como eu, imagine nas pessoas da época) acerca dos possíveis malefícios trazidos pela feitiçaria motivou a comparação q consta na canção. Me parece q o Noel quis enfatizar q o poder encantatório da “Vila”, seu feitiço, residiam em características outras q não as do feitiço “com farofa” e suas intenções macabras (é óbvio q tenho consciência de q nem toda feitiçaria tem objetivos “ruins”).
    Em nosso atual ambiente de debates acerca de questões raciais (a propósito, leiam o livro ” A Utopia Brasileira e os Movimentos Negros”, do Antônio Risério, muito pertinente em tal momento, e suponho, definidor de novos rumos pra tais discussões) fica um tanto fácil associar a letra de “Feitiço da Vila” a supostas intenções racistas
    (confesso q, sem o Sandroni, não atentaria pras sutilezas por ele citadas, talvez por estar envolvido por esse ambiente de discussões a respeito de cotas e afins, pertinentes ao nosso contexto a não ao do Noel).
    O Caetano é uma mente lúcida, inteligentíssima e, obviamente, bem intencionada. Suas intenções ao externar tais opiniões sobre o “Feitiço da Vila”
    foram, como ficou claro pra mim, a de , num contexto de provocações (ainda q, aos meus olhos, fazendo uma má leitura do Noel) declarar q fazer bom samba não é privilégio de classes sociais nem de cores e q uma suposta descaracterização de “raízes” não justifica tentar fechar os olhos pra o talento indimensionável de um Tom Jobim.

  3. Fernando Salem disse:
    Junho 29th, 2008 at 11:22 am

    Esse debate racial me fez pensar nos 50 anos da Bossa-Nova celebrados por aqui. A comemoração provoca alguns sentimentos bem ambíguos. Se por um lado a festa revela o reconhecimento da grandeza do maior momento estético da História do Brasil, por outro tem produzido involuntariamente uma certa confusão. Os meninos da classe-média branca carioca reinventavam o samba. O grande feito só pode ser comemorado se entendermos que foi João Gilberto quem reaproximou o o samba, a prontidão e a velha bossa de Noel ao Brasil Moderno. Do morro para Vila Isabel. De Vila Isabel para Ipanema. De Ipanema de volta ao morro e ao mundo. Sem dúvida, o sentimento positivo da comemoração deve prevalecer e a festa é merecida. Mas a bossa-nova que está sendo enaltecida não é exatamente a Bossa-Nova com letras maiúsculas.
    Vamos lá. A bossa-nova com letras minúsculas é o nome que se deu a um ritmo consagrado que está em qualquer tecladinho japonês; uma conquista mundial da Bossa-Nova com letras maiúsculas que tem uma só matriz: o violão e a voz de João, a música de Tom, as letras de Vinícius e Newton Mendonça. Sem essa incrível simbiose não haveria a bossa-nova. Afinal, o que estamos festejando? 50 anos de Bossa-Nova ou 50 anos de bossa-nova? Ao que tudo indica, as duas coisas. Mas não sei se os shows comemorativos nos ajudam a fazer essa diferença. Ela é importante? Muito. Sem João Gilberto não haveria a síntese fundamental para a evolução da canção popular no Brasil. Os neuro-transmissores de João uniram Ary Barroso, Geraldo Pereira, Noel Rosa, Denis Brian a Carlos Lyra, Roberto Menescal, Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Sua voz e seu violão mixaram o samba das 3 primeiras décadas do Século XX ao samba moderno da segunda metade do Século XX. Esse feito desembocou no Tropicalismo, movimento aparentemente antagônico à Bossa-Nova, mas que na verdade é sua consequência mais coerente. João Gilberto tem mais a ver com o Tropicalismo do que com os arranjos sambalançados dos shows de Copacabana com Leila Pinheiro, Emílio Santiago e outros. Esses sim festejam a bossa-nova dos tecladinhos. Isso não os desmerece. Respeito qualquer brasileiro que reconheça a obra de Jobim. Estou apenas fazendo uma reflexão por uma questão estética. Uma questão de justiça à nossa inteligência. Essa semana festejei sozinho os 77 anos de João Gilberto. No You Tube, achei um esquecido especial da TV Cultura com João e orquestra. Escutei-o cantando Rancho Fundo, Valsa do Adeus e Feitiço da Vila. Por uma coincidência sincrônica, no mesmo dia, entrei no delicioso blog Obra em Progresso, onde Caetano faz uma memorável análise da letra de Feitiço da Vila, enaltecendo o samba e mostrando, verso a verso, como ele é revela o tal sentimento racista que Sandroni questiona. Caetano deu um show. Não foi como um intelectual. Nem de miolo mole, nem de miolo duro. Mas como artista atento. Letras antigas são cantadas e esquecemos de pensá-las. Caetano pensou na letra de Feotiço da Vila, caetanicamente, por tanto de forma autoral. O que me pareceu mais interessante foi quando, às tantas, Caetano comentou que José Ramos Tinhorão, sociólogo xenófabo e nacionalista, havia acusado Jobim de americanizar o nosso “autêntico” samba e em contrapartida à autenticidade de Noel. Um deslize sociológico típico da esquerda nacionalista. Foi pedagógico! Se por um lado as tensões raciais reveladas em Feitiço da Vila me parecem evidentes, por outro, quando o samba “desceu” o morro pra viver “lá na cidade”, estava aberto o caminho pra bossa-nova com “b” e “n” minúsculo. João é fruto deste processo. Mas extrapolou essa fronteira. Com João, o samba voltou ao morro simbolicamente. João devolveu ao samba o poder que ele tem, evitando uma histórica diluição do gênero. Pois é. O aniversário da bossa-nova com letra minúscula é também uma espécie de grande festa da classe-média branca. São 50 anos de samba branco. Me incluo nisso. Também sou branco de classe-média. E admiro muito os músicos que compuseram com competência a trilha sonora da minha adolescência. Mas a comemoração dessas 5 décadas é mais complexa. Ela representa a redenção racial promovida por João que possibilitou o Tropicalismo, o samba moderno de Chico, o pagode, o axé e todas as outras manifestações sincréticas da nossa música popular. Sem João, estaríamos parados no tempo. João libertou os escravos com suas síncopas. Mas João não faz parte desta parte das comemorações ufanistas feitas por aqui. Isso me deixa um pouco envergonhado e constrangido ao ver os shows comemorativos. Hoje, no Carnegie Hall, com ingressos esgotados, João fará sozinho, a sua festa. Nós não vamos ver, nem ouvir. Mas é bom que a festa seja lá. Foi no Carnegie Hall que João começou a colocar caixa-alta na expressão Bossa-Nova. Não há 50 anos, mas há 46. Deixou Miles Davis, Herbie Hanckok (pretos) e Stan Getz e Sinatra (brancos) boquiabertos. João e Tom se mudaram pra lá, enquanto nós produzíamos por aqui a diluição da bossa-nova, com trios jazzísticos fazendo o sambalanço. Tom foi acusado de tudo: traidor, americanizado e mercenário. O nosso maior e mais generoso compositor. Talvez o mais Brasileiro. E com B também maiúsculo. João, quando vinha ao Brasil, era recorrentemente vaiado por seus atrasos e seu perfeccionismo com o som. Newton Mendonça, autor da letra de Desafinado, foi esquecido. Vinícius foi acusado pelos acadêmicos de poeta vendido para esse gênero “menor” que é a canção popular. Difícil festejar a Bossa-Nova sem João, Tom e Vinícius. Mas é possível. Vá ao YouTube. Lá está o show de Caetano e João em Buenos Aires. As vaias a João no Teatro Bandeirantes e no Credicard Hall. Uma entrevista engraçadíssima de João ventrilocado por Nelson Motta. O Feitiço de Noel se virou contra o feiticeiro. Caetano recantando e relendo a canção, fez mais um gesto tropicalista. Redentor e multiracial.

  4. Budi Garcia disse:
    Junho 29th, 2008 at 9:17 pm

    Caros Caetano, Sandroni, Bruno, Igor e Fernando:

    É realmente delicioso encontrar um belo espaço como este blog sendo tão bem ocupado, a Caetano, um brilhante artista e provocador e a Sandroni, um brilhante pesquisador e músico, meus parabéns por este pequeno tesouro que nos propiciam.
    Ao Fernando, devo dizer que realmente gostei de seu desabafo acerca dessa usurpação do prestígio a que a Bossa Nova faz jus por pessoas que, nem de longe, demonstram compreender o grande salto que a música brasileira popular deu com - sobretudo a dupla - João Gilberto e Tom Jobim. Porém devo chamar sua atenção para o fato de que a fantástica figura de Newton Mendonça tem infelizmente sido constante e erroneamente considerada como a do “letrista” de Desafinado, Samba de Uma Nota Só e outras pérolas da célebre parceria Jobim/Mendonça. Newton foi um compositor/arranjador/pianista mineiro de grande talento, radicado no Rio e que faleceu muito precocemente. Num livro intitulado Caminhos Cruzados (Mauada Editora), de Marcelo Câmara com Jorge Mello e Rogério Guimarães, esse tema é tratado com especial cuidado e apreço. Estas são esclarecedoras palavras do próprio Marcelo Câmara, extraídas de um pequeno debate como Sérgio Lima (disponível em http://www.jobim.com.br/publics/caminhoscruzados/debate.html): “Como digo no livro, tudo era feito a quatro mãos, música e letra. Nunca houve um “letrista do Newton”, ou um “compositor das letras do Tom”, e vice-versa. Ambos eram grandes músicos e letristas”. E ainda: “Depois de seis anos de pesquisas, ouvindo e conversando com dezenas de contemporâneos, familiares, músicos, compositores, amigos, companheitos da noite, reafirmo que não há, na parceria New-Tom, um compositor exclusivo ou um letrista, como aconteceu com outras parcerias de Tom, por exemplo, com Vinicius ou com Paulo César Pinheiro, poetas e letristas. E mesmo com Dolores Duran havia esta definição. No caso da dupla New-Tom, os dois faziam as duas coisas simultaneamente. Tudo está explicado no livro, no capítulo que trata do processo de criação (A parceria New-Tom, pág. 50) e no capítulo Um pianista e compositor de vanguarda (pág. 39). Tom não só nunca falou do assunto parceria New-Tom, como só falava de Newton raríssimas vezes, somente quando era insistentemente provocado. Quem identificava, com nitidez, onde estava Newton e onde estava Tom numa composição era o Baden Powell (leia depoimento dele no livro) e o Milton Banana - ambos falecidos. E quem identifica bem hoje é João Gilberto, segundo depoimento dado ao filho de Newton, Fernando Mendonça, em 1999, pouco antes deste morrer. Tudo isto está no livro”.
    Como estamos afinados no amor à Bossa e seus reais protagonistas, achei que devia acrescentar esta breve consideração.

    Grato a todos,
    sincero abraço,
    pleno de Bossa.

    Budi

  5. Fernando Salem disse:
    Junho 30th, 2008 at 10:03 am

    Budi

    Que boa a sua oservação. Sabia de todos esses atributos do Newton e involuntariamente reproduzi o senso comum. Mais uma vez a nossa Conversa de Botequim Eletrônica gerou bons frutos. É ofeitiço da internet. De Caetano pra Noel, de Noel, para Tom, de Tom chegamos ao Newton. Desculpe o deslize involuntário, mas no peito dos desafinados também bate um coração.

    Fernando

  6. nelson disse:
    Junho 30th, 2008 at 3:32 pm

    de toda esta discussão para alguem que é aficcionado por musica como eu ….fica apenas a seguinte indagação aos pesquisadores e ao proprio caetano…..

    não parece perigoso… uma forma de patrulhamento ás avessas…. perquirir de possiveis interpretações historicistas das canções ? querer colocar palavras na boca do poeta para alem do que seria plausivel ja que poesia e musica para mim é transcendencia, sentimento, emoção, alguma para alem do terreno e sentimentos mais mesquinhos e pequenos?

    musica como cronica social ou para embasar posiçoes politicas e ideologicas como o caso das cotas nas universidades me parece retirar a beleza da canção em si, da poeasia em si…

  7. diogo santos disse:
    Junho 30th, 2008 at 5:16 pm

    FEITIÇO DA VILA vai acabar sendo incluida no show Transamba de Caetano!

    Não é ruim a ideia nao, hein Caetano!

    Desde que ele também inclua no show a música “Love Love Love”, do disco Muito, de 1978….

    ai fica tudo certo!

  8. Ismar C. de Souza disse:
    Julho 8th, 2008 at 12:49 pm

    Caro Caetano Veloso,

    Esclareço que o “manifesto dos 113 Cidadãos Anti-Racistas Contra as Leis Raciais” se posiciona contra a implantação das cotas para negros nas universidades e contra o PROUNI, um programa que foi criado pela MP nº 213/2004 e institucionalizado pela Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005 e tem como finalidade a concessão de BOLSAS DE ESTUDOS integrais e parciais a estudantes de baixa renda (de qualquer cor ou raça), em cursos de graduação e seqüenciais de formação específica, em instituições privadas de educação superior, oferecendo, em contrapartida, isenção de alguns tributos àquelas que aderirem ao Programa.

    Controversamente, entre estes citados “113 cidadãos anti-racistas existe um jornalista (www.veja.com.br/reinaldo) que escreve num blog hospedado no site da Veja, que incentiva comentários ofensivos a raça negra e a alguns dos principais símbolos de luta desta etnia: Comemoração do dia 20 de novembro, figura do líder Zumbi dos Palmares, lutas pela implantação de algumas políticas de afirmação racial pelo governo federal.

    Ismar C. de Souza
    Salvador, Bahia.

  9. antonio carlos miguel disse:
    Julho 9th, 2008 at 1:32 pm

    alô Caetano e todos

    o debate está ótimo, alto nível, e poderíamos passar horas, anos discutindo aqui, e adicionarei três pitacos. Aliás, parabéns pelo blog obra em progresso.
    1)Quanto ao racismo em “Feitiço da Vila”, ele estaria sendo ampliado pela lente do “politicamente correto” de nossos dias. O conjunto da obra, precocemente interrompida, de Noel o absolve desse viés.

    2)como a conversa já enveredou por outras “polímicas” (termo de Ezequiel Neves), o livro sobre Newton Mendonça é uma boa contribuição, mas Marcelo Câmara exagera na vitimização do grande compositor, pianista e letrista. Ele foi vítima, mas de um ataque cardíaco, ainda muito moço, aos 30 (ou 31, não vou googlear agora). Lembro-me de uma longa entrevista que fiz com Tom Jobim, em 1989, na qual perguntei sobre a parceria com Newton Mendonça e ele foi firme na resposta: “Ele também era um ótimo pianista, fazíamos música e letra juntos”.

    3) é redutora ou purista essa visão (no comentário de Fernando Salem) de que “João e Tom se mudaram pra lá, enquanto nós produzíamos por aqui a diluição da bossa-nova, com trios jazzísticos fazendo o sambalanço.” Vertentes da bossa nova, como o samba-jazz, o samba pop de um Jorge Ben, do Brazil 66, Marcos Valle etc etc…

    por fim, obrigado a Carlos Sandroni me avisar de que o papo está rolando quente aqui.
    abs
    antônio carlos miguel

  10. Fernando Salem disse:
    Julho 10th, 2008 at 6:48 pm

    Grande Antonio Carlos Miguel

    A minha visão pode ser redutora, mas não é purista. Quando me refiro à diluição foi no sentido evolutivo e não um julgamento de valor. Sou fanático por Benjor e não o vejo como “diluidor”. É um inventor. Me referia aos trios de samba-jazz, sim. Independente do valor que eles têm. E têm! Mas a Bossa Nova de João e Tom engendrou uma idéia de síntese, que o sambalanço (com suas convenções rítmicas, seu virtuosismo instrumental e sua atitude swingada) ajudou a diluir. Os trios de sambalanço não são os vilões, mas não tinham violões. PS: tenho todos os discos do Marcos Valle.

  11. antonio carlos miguel disse:
    Julho 16th, 2008 at 6:23 pm

    salve, Fernando

    pois é, como disse ao abrir meu comentário, é conversa para semanas.
    abs

  12. Fernando Salem disse:
    Julho 18th, 2008 at 12:06 pm

    É isso aí. Quando eu uso essa expressão “diluição” sempre dá ruído. Vou aposentá-la. Isso é um vício que peguqi na época em que era aluno do Luiz Tatit. Que por sinal é um inventor! De resto, viva os Zimbos, Tambas e Mocotós!

  13. nelson de cerqueira dultra disse:
    Agosto 19th, 2008 at 6:20 pm

    A paixão que Caetano Veloso sente pela princesa Isabel deve-se aos festejos anuais do bembé (manifestação cultural realizada em Santo Amaro da Purificação) e que celebra o fim da escravidão no Brasil. Caetano sabe do bembé desde criancinha,

  14. Carlos Machado disse:
    Agosto 31st, 2008 at 5:08 am

    Olá, Caetano, Sandroni, Salem e todos os demais.

    Descobri hoje, por acaso, um texto de 33 anos atrás que reforça a visão de Caetano. Trata-se do artigo “Noel Rosa, 200 músicas em 26 anos, 4 meses e 23 dias de vida”, de Sérgio Cabral, publicado na revista Cadernos de Opinião n. 2, de 1975. Eis o trecho que me chamou a atenção:

    “Na forma ou no conteúdo, de maneira ingênua ou com grande dose de senso crítico, quase toda a obra de Noel Rosa passou a refletir uma posição de quem tomou o partido do povo. Disse quase toda porque algumas vezes a sua formação de classe média falava mais alto. Uma contradição que se manifestara logo em 1930, em seu primeiro ano de gravação. Foi o ano em que lançou, além de Eu vou pra Vila, o antológico Com que roupa e mais Lira abandonada, Malandro medroso, Meu sofrer, Queixumes, Vingança de malandro, Vou te ripá, Dona Araci e Dona Emília. Nesta última, uma marchinha feita com Glauco Viana, por exemplo, verificou-se a hesitação do jovem de classe média:

    A Dona Emília foi pedir por compaixão
    Pra penetrar no meu cordão
    Mas não quero essa tagarela
    Porque ela samba lá na favela.”

    *
    Sobre as cotas, concordo com Sandroni, quando diz: “precisamos, isso sim, de ações afirmativas, entre as quais a Lei de Cotas em sua forma atual representa uma opção”. A professora Yvonne Maggi e seu aluno Ali Kamel, dois dos mais destacados anticotistas, recusam qualquer ação afirmativa. Propõem a “universalidade” do bom ensino — que é uma forma velada de deixar tudo como está. Ao contrário do que diz o livro de Kamel, a realidade está aí gritando, todos os dias: sim, somos racistas.

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