Aquele abraçaço
Entrevista para o Correio da Paraíba (27 de julho de 2013)
Por Renato Félix e Kubitschek Pinheiro
Foto: Fernando Young
O cantor e compositor Caetano Veloso se apresenta, neste sábado, em João Pessoa, na Domus Hall do Manaíra Shopping. O show “Abraçaço” terá início à meia-noite e o repertório traz canções do novo álbum, como “Quando o galo cantou”, “Um abraçaço”, “A bossa nova é foda”, “Parabéns”, “O império da lei” e “Funk melódico”. Mas, também terá músicas de outros discos, como “Triste Bahia”, e interpretações inéditas de composições autorais que foram gravadas por Gal Costa e Maria Bethânia, como casos de “Mãe” e “Reconvexo”. O mesmo acontece com “Alguém cantando”, lançada no disco Bicho, de 1977, mas com a voz de Nicinha, uma das irmãs do compositor baiano. Caetano canta ainda “Eclipse oculto” e “A luz de Tieta”, que encerra o show. Caetano não para. O show é mais que um abraçaço.
Caetano, tendo uma longa e consagrada estrada na música, como você lida com o processo de renovação? Você pensa às vezes "preciso fazer algo diferente"? Como essa questão aparece - ou não aparece - quando o projeto de um disco novo se apresenta?
Nunca penso que preciso fazer algo diferente. Vou fazendo o que me aparece como possível e desejável de fazer. Tenho minhas limitações e também meu gosto. Simplesmente gosto de fazer essas coisas: cantar, compor canções, estar sobre um palco.
O que o motivou, na época, ao projeto do disco Cê e qual sua avaliação da, agora, trilogia completada com Abraçaço?
Eu vinha conversando fazia alguns anos com Pedro Sá sobre fazer um disco de rock, meio de brincadeira, modificando minha voz, escondendo meu nome e apresentando um repertório original dentro do gênero. Ia ser uma banda inventada. Mas aí Moreno me convenceu a fazer o disco com meu nome e minha voz mesmo. As canções que fiz para o Cê foram filhas desse episódio. Mas são muito pessoais. Eu ia fazer sob heterônimo, mas quando decidi fazer sob meu nome mesmo fiz as canções tão originais quanto imaginava, mas com temas muito íntimos meus. Acho o repertório do Cê o mais coeso e bonito dos três. Mas a banda foi ficando mais e mais relaxada e o Abraçaço fecha a trilogia com um disco de sons muito naturais, muito espontâneos - e eu acho que isso é que faz o atrativo desse terceiro disco. Tenho muito orgulho do trabalho com esses três caras: Pedro, Ricardo e Marcelo. Melhor impossivel.
Sua relação com a música dita jovem através dos anos sempre foi muito boa e aberta, não?
Comecei jovem. E num tempo em que a juventude era majoritária nos países ocidentais e houve toda aquela movimentação de querer mudar o mundo e a música. Todos os artistas interessantes de minha geração, em todos os países, continuam a atuar dentro desse espírito, de uma forma ou de outra. Não sou exceção. Tenho interesse no que vai acontecendo. E ainda me sinto procurando o que é que eu posso fazer melhor.
Também é de se esperar que, numa obra tão vasta e de tantos clássicos, o trabalho de um escolher as músicas antigas que vão compor o show com as do disco novo seja um pouco complicado. Como foi o processo de seleção do seu repertório para este show? Alguma razão especial para que algumas destas canções tenham sido escolhidas, como "Reconvexo", "Você não entende nada", "Eclipse oculto" ou "Mãe"?
Dos três shows com a banda Cê, o Abraçaço foi o mais difícil nesse aspecto. Estreei sem ter uma ideia definida do que significa a escolha e a ordem das canções. Por exemplo: pus "Alexandre", que nunca tinha cantado ao vivo, mas tirei porque não consegui decorar a letra e não gostava de ler em cena. Aí é que entrou "Eclipse oculto". O público é que fez com que tudo ganhasse sentido. De todo modo, eu queria cantar canções que são conhecidas mas que não canto habitualmente. "Mãe", "Eclipse oculto", "De noite na cama", "Reconvexo" são exemplos. Sabia que queria cantar "Reconvexo" porque queria falar de Bethânia, ou com Bethânia, no momento da morte de minha mãe. Já “Mãe” não foi uma escolha definida por essa razão. É uma canção triste que eu nunca cantava, nem em casa. Claro que pensei em minha mãe quando decidi cantá-la. Mas pensei depois que já estava cantando.
No show Cê, você trouxe lá do disco "Transa" a canção "You dont't know me" que matou a saudade de uns e outros e foi belo. Agora, em Abraçaço, você canta "Triste Bahia", também do disco Transa e arrebenta, como algo inusitado, pois, raros ou quase ninguém tinham ouvido essa canção ao vivo. Vamos falar dessa cena?
"Triste Bahia" é a faixa mais quente de "Transa". Desde a época em que vim de Londres e lancei as canções do disco aqui no Brasil que eu não canto essa música ao vivo. A banda Cê e eu decidimos manter a estrutura do arranjo original. Fica muito bonito com o som da banda também.
Que músicas ou artistas você tem ouvido? O que anda passando pela radiola de Caetano Veloso?
Não tenho ouvido muito. Mas posso dizer que me interesse por James Blake e Pedro Miranda.
Da trilogia, apenas Zii e Zie veio para João Pessoa. Agora chega o show Abraçaço e não se fala noutra coisa senão no show que você e banda Cê fazem neste sábado na Domus Hall. O que dizer aos fãs?
Espero encontrá-los com muito carinho. O show é muito "Abraçaço", mas isso inclui coisas já mais assentadas, embora não os hits óbvios. Tem sido muito bom fazê-lo em toda parte. De João Pessoa, esperamos o melhor.
Através das redes sociais a gente tem observado que muitos fãs do Recife e de Natal por onde a turnê já passou, vão vir para João Pessoa para repetir os aplausos. Ou seja, esse show em João Pessoa vai reunir fãs das três cidades...
Essa é uma boa notícia. Os shows no Recife e em Natal foram ótimos. No Recife, então, a plateia cantava todas as músicas do disco novo. Que beleza que João Pessoa reúna gente desses outros lugares, além dos paraibanos. Isso só me faz ficar mais excitado para fazer o show aí.