De conversa (Caetano Veloso) / Cravo e canela (Milton Nascimento, Ronaldo Bastos)
vozes superpostas
Ê morena quem temperou
Cigana quem temperou
O cheiro do cravo
Ê Cigana quem temperou
Morena quem temperou
A cor da canela
Cigana quem temperou...
Ê morena...
Eu quero ver você alegre
É conversando que a gente se entende
© 1973 Ed. Gapa/Warner Chappel - Álbum Araçá Azul - Caetano Veloso.
Ê morena quem temperou
Cigana quem temperou
O cheiro do cravo
Ê Cigana quem temperou
Morena quem temperou
A cor da canela
Cigana quem temperou...
Ê morena...
Eu quero ver você alegre
É conversando que a gente se entende
© 1973 Ed. Gapa/Warner Chappel - Álbum Araçá Azul - Caetano Veloso.
Comentário do autor: "A primeira faixa que gravamos - e que abre o disco - é uma peça vocal sem letra e sem melodia. Nascida da experiência com São Bernardo, ela consiste em gemidos e grunhidos superpostos, sons de vozes brasileiras em conversa (o título "De conversa" vem do fato de João Gilberto - sempre ele! - ter, pouco antes, gravado o samba de Lúcio Alves "De conversa em conversa"), em que se mantém os sotaques mas se abstraem as palavras. A isso se somava percussão tocada por mim mesmo sobre meu corpo. O que surge como revelação melódica e semântica no final da peça é a canção "Cravo e canela" de Milton Nascimento, numa saudação a esse grande colega que realizara um trabalho tão notável e tão diferente do nosso (mesmo oposto ao nosso, sob certos aspectos) e a quem não festejáramos de público na nossa volta com a ênfase que ele parece ter esperado (e não o fizemos por senso das diferenças e horror à demagogia), sendo que a frase final, "eu quero ver você alegre", dita a princípio por uma voz que logo se une a outras num acorde simples, também se dirige a Milton, aqui tanto no plano pessoal quanto no artístico, numa espécie de oração para que ele superasse aquela tristeza imensa que o prostrava - oração que, hoje vejo com orgulho, mostrou-se eficaz. (Não se veja nisto uma fantasia de onipotência: o que quis dizer com a frase final de "De conversa" é que havia no culto ao estilo de Milton, na própria admiração pelo seu trabalho, uma valorização mórbida dessa tristeza, e que existia em mim - mas é claro que não só em mim: em muitos, mas, antes de todos, no próprio Milton - o desejo de salvaguardar sua capacidade de vida e alegria, sem o que não haveria suas canções, mesmo as de beleza mais triste)." (Caetano Veloso. Verdade Tropical. Companhia das Letras, 1997).