Reprodução heterossexual
Contam-me que causou alguma revolta o fato de eu ter celebrado a reprodução heterossexual no meu post sobre o aniversário de Moreno. Gozado: só me ocorreu mencionar esse aspecto da real forma em que Moreno foi concebido por estar em contato intenso com a obra do filósofo transgênero Paul B. Preciado (o B. em seu nome é de Beatriz, que é como ele se chamava quando era mulher). Ele e eu dividimos uma mesa na Flip, que este ano vai ser online e grátis. Festejar o nascimento de uma pessoa pressupunha que a concepção desta tivera origem num ato heterossexual. Esse fato não precisava ser marcado: era "natural" e, portanto, pressuposto. Vivendo mais intensamente a realidade do mundo contemporâneo, ocorreu-me marcar essa especificidade do modo como Moreno foi gerado. Hoje você pode ser lésbica e ter uma mulher que desenvolve no útero dela a criança formada por um óvulo seu e o espermatozóide de um amigo (ou de um anônimo) que não teve nenhuma participação nas atividades sexuais de vocês duas. Dois homens, amantes entre si, podem promover o nascimento de um rebento com o sêmen de um deles mais o óvulo de uma barriga de aluguel. Há mil (e haverá mais) maneiras de se planejar reprodução sem ato hétero. Meu lado homo orgulha-se de ver admitido publicamente que a reprodução heterossexual é, hoje, uma forma entre outras. Assistam meu papo com Preciado. Será no dia 5 de dezembro às 20:30.
Caetano Veloso, 22/11/2020.