Povo de Deus (2020)

De todos os outros livros citados por este que tratam do mesmo assunto, eu só tinha lido o de David Smilde: em geral, leio o que me cai nas mãos - e o cineasta Jorge Furtado, na ida do nosso Ofertório a Porto Alegre, me deu um exemplar de Razão para Crer. É muito bom que coisas como o livro de Spyer (e os outros que ele menciona) venham sendo escritas. Há muito tempo me interesso pelo crescimento do neo-pentencostalismo no Brasil. E reagi sempre ao modo desatento e superficial com que o fenômeno era tratado por pessoas do meu ambiente. Pela imprensa, pelos intelectuais e formadores de opinião. A única exceção que eu encontrava (e, entre outras coisas, por isso passei a dar atenção especial a ele) era Roberto Mangabeira Unger. Em seus livros sobre política e também sobre filosofia, o papel do crescimento das igrejas evangélicas é levado em conta. No livro Política, do século passado, ele compara a ação das unidades católicas ("eclesiais de base") à dos evangélicos e dá a estes maior importância. No livro de Smilde, li que na Venezuela o conceito de "teologia da prosperidade" é muito combatido pela maioria dos evangélicos, sendo defendida apenas por uma denominação minoritária. Aqui, a Universal, a que mais cresceu, defende a tese. Tendo a admirar um "empreendedorismo de vanguarda", que é praticado majoritariamente por evangélicos (o que não quer dizer que confunda o que Mangabeira almeja com o que estes postulam). Por outro lado, convivo com empregados domésticos, aqui no Rio, que são quase todos evangélicos. Assim, este livro me interessou todo o tempo. Sei que é impossível (e indesejável) que alguém faça qualquer projeto para o Brasil sem levar em conta esse tema. E ninguém conseguirá nada se não respeitá-lo. A fala desastrosa de Haddad que este livro relembra é exemplo gritante disso. Num momento em que as grandes denominações evangélicas apoiam um governo que louva torturadores e que o prefeito evangélico do Rio paga funcionários para obstruírem o trabalho da imprensa - é saudável ver retratado em estudo cuidadoso o clima de honestidade dos fiéis que não podem ser confundidos com descaminhos éticos de certas lideranças. Até para poder lidar com os problemas daí advindos, é crucial que se leia Povo de Deus.

Caetano Veloso, 2020.
Apresentação do livro "Povo de Deus: Quem são os evangélicos e por que eles importam" de Juliano Spyer. 

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